Era só isto que eu queria dizer
era só isto que eu queria dizer
Era uma história para feios e um que se pode chamar Manel. O Amadeu também era feio. Feio e bêbado. Era casado com aquela gaja horrorosa que trabalhava na oficina do Pompeu. A Gina. O Pompeu dizia que Gina tinha nome de revista pornográfica. A Gina escarrava, feia. Assobiava entre cáries pedaços enrolhados de croquete e azeitona. Cagava-se como um gajo. Mas fazia revisões. Filtros, óleos, velas, platinados, e os estofos depois com um cheirinho a bar de alterne entre o patchuli e a lavanda e um papelinho escrito a bic: revisão aos tal tal , mudança de óleo etc… ao fundo do dito identifica-se: GINA - em letras de imprensa a coçar o cú. O Amadeu também era feio. Feio e bêbado. Era irmão do Diamantino. Que feio. E bêbado. Porém trabalhador. E fadista o gajo. É cortador de espelhos, ou vidros, ou copos, garrafas... Sei que é qualquer coisa que faz reflexo. Numa loja de mobílias, Moveis Pantera. Não. É na vidraceira do Torcato. Feio.o Torcato. O Diamantino ouve-se ao longe e os vidros a cortarem e os espelhos a partirem, mas fino, das oito ao meio-dia e da uma às seis, mais fino menos fino até às duas ou às três quando lhe dá para a batota e enfardar na Conceição madrugada dentro. Feia. Tão feia. A Conceição. Mãe da Paula. Que era Paulo. Morava por detrás da escola e foi travesti no Coche Real. Não interessa. Apanhou sida ou outra merda, sei lá. Não apanhou nada. Não sei se é verdade. É o que as velhas contam e nunca o vi no Coche Real. Nunca o viram. Andou com a minha irmã na escola. Que agora é irmão. O mais novo. Perdão. A mais nova. A Bruna. O Bruno. Feio. Feia. Feios..Em modo Bruno ou modo Bruna. Ambos. Tão feios como os meus pais. E como eu. E o meu irmão mais velho. O Tóino. Que feio. É casado com tansa da Sónia. A gaja…ui que gaja. Feia. No liceu já era feia, dizem. Bebe copos de três e naca umas cascas de queijo que é um primor. Gosta d’iscas e de mamar umas com elas até se desfazer em diarreia de ginja. Uma ordinária. Foi apanhada a roubar lá no super-mercado e despediram-na. Á Sónia. Tansa. Mas no liceu não havia mais ninguém. Que se foda. Não é pecado. E já foi há tantos anos. Adiante. Feia. Neta do Jorge da burra. Que cheiro aquela carroça, jesus. Tem um riso de comboio a estacionar na gare, de papagaio a ser seviciado. Usa galochas. Até meio da perna ele é estrume ele é merda ele é lama e palha e caruma e bocados de gordura e um berro: “BOM DIA PESSOAL DE TRABALHO DESCULPEM SE ME ENGANEI” – que acorda seres mumificados há muitos séculos atrás e, sim, enganas-te.
Trabalho aqui?
À légua e mais baixo para não acordar a criança.
Que feio.
E Bruto, carroceiro.
Primo do Amadeu.
Lá de cima.
Da segunda linha.
Que estava encostado numa história para feios com um que se pode chamar Manel ou outra coisa qualquer.
Que feios caraças.
E bêbados.
Era só isto que eu queria dizer.
Submited by
Poesia :
- Login to post comments
- 2455 reads
Add comment
other contents of Lapis-Lazuli
Topic | Title | Replies | Views | Last Post | Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/Thoughts | Os nossos olhos combinam | 1 | 571 | 07/11/2010 - 02:20 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Cheiro um adeus cobarde | 2 | 530 | 07/03/2010 - 23:04 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Queira deus palmeiras verdes | 2 | 513 | 07/01/2010 - 15:23 | Portuguese | |
Poesia/Thoughts | Duo das almas em fuga | 3 | 442 | 06/26/2010 - 16:41 | Portuguese | |
Poesia/Thoughts | Quando morreres o amar | 2 | 502 | 06/26/2010 - 15:35 | Portuguese | |
Poesia/Love | Só em muito silencio... | 9 | 431 | 06/24/2010 - 10:09 | Portuguese | |
Poesia/Passion | Ouve-me | 4 | 794 | 06/16/2010 - 23:21 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | O punho dos inválidos | 1 | 512 | 06/15/2010 - 22:15 | Portuguese | |
Poesia/Love | Condão | 3 | 509 | 06/10/2010 - 10:37 | Portuguese | |
Poesia/Love | Partilha-te | 3 | 467 | 06/09/2010 - 13:16 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | Greve Geral | 2 | 442 | 05/31/2010 - 01:05 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Poetas Imorais (dedicadinho) | 6 | 818 | 05/25/2010 - 01:02 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Quanto mais conheço os homens... | 1 | 2.132 | 05/19/2010 - 02:29 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Morre Marta... | 1 | 951 | 05/19/2010 - 01:33 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Sem penas para voar | 4 | 622 | 05/17/2010 - 15:46 | Portuguese | |
Poesia/Love | My lady blues | 1 | 592 | 05/17/2010 - 01:54 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Maio | 1 | 925 | 05/15/2010 - 03:55 | Portuguese | |
Poesia/Love | Acho que a paixão foi dormir | 4 | 670 | 05/13/2010 - 20:47 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Assimétricos | 1 | 588 | 05/12/2010 - 20:51 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Ao Ary...Camarada e Poeta | 1 | 529 | 05/10/2010 - 08:53 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | A cara dos outros | 2 | 446 | 05/09/2010 - 22:35 | Portuguese | |
Poesia/Thoughts | Alegoria dos ausentes | 1 | 582 | 05/09/2010 - 19:02 | Portuguese | |
Poesia/Thoughts | Reminiscências pontos e reticências | 7 | 802 | 05/08/2010 - 14:14 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Eu sei voar | 5 | 660 | 05/08/2010 - 04:22 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Letra infinita | 1 | 607 | 05/06/2010 - 21:33 | Portuguese |
Comments
Era só isto que eu queria dizer.
Era só isto que eu queria dizer.