Também sou para casar, Rodrigo!

Eles nos adoram, mas não apresentariam a seus pais. Hummm, que brincadeirinha sem graça, homens!
Nós também temos famílias, apesar das tatuagens, e atitudes pouco convencionais no mundinho careta que as mamães de vocês lhes ensinaram.
Quem não deveria casar, e nos transformar em baleias cornas respeitáveis, são vocês que querem acabar com nossa personalidade e plantar um par de filhos no lugar do nosso saudoso amor-próprio.
O bar, sempre ele me revelando partes de mim que nem queria conhecer. Lá estava eu, vestidinho preto, colado, scarpin de oncinha e batom vermelho. Cada cruzada de pernas era "aquela" observada da geral.
Sim, sex appeal nunca me faltou. Descobri isso quando mandava muito mal em matemática (...). Mando mal até hoje, mas concluí meu segundo grau com algum louvor.
Eis que faço minha escolha da noite. E essa mesma escolha, em Santiago do Chile, poderia ter sido a escolha da vida inteira, se...depois de algum tempo eu não acordasse com unhas azuis, sobretudo de oncinha e scarpin vermelho ao lado de alguém que vestia, concentrado e seriamente, terno e gravata. Deixando para trás aquele jovem descabelado de "ontem", embriagado com os amigos, tocando acordeón enquanto todos passavam um baseado de mão em mão, entre cervejas e a variedade de vinhos que a Gato Negro produzia.
Impressionante como somos tão parecidos no meio da noite, e tão irreconhecíveis ao amanhacer!
Eu não saberia dizer se o maior frustrado era eu ou ele. Mas os tantos day-afters que tivemos só nos distanciava mais.
Eu me irritava por acordar com uma proposta de 'mente-aberta' que não conseguia dar conta da ressaca, e nem da mulher tatuada que estava ao lado.
Era evidente que eu também preferia me jogar no rio raso e sujo que cortava o Bella Vista do Baquedano (onde morei), à acordar ao lado daquele "não-sei-quem" que estava alí, com aquela expressão vazia pra me receber.
Na semana seguinte, por alguma carência constrangedora, nos juntávamos outra vez. E tudo parecia fluir na medida que o àlcool subia, e o frio (baita frio!) também ajudava. Antes dormir de conchinha com alguém que não significava tanto, a lutar contra aquele frio bizarro sozinho/a na cama.
Também era divertido no começo, sempre foi. Vai ver que era disso que sentíamos falta no decorrer da semana.
Mas, mentira tem perna curta. Mentiras de afeto também entram nessa categoria.
Um dia acordamos e nós demos conta de que o nosso limite havia chegado. Mas havia alguma resistência em mim (que me sentia só em Stgo), e alguma da parte dele que adorava exibir a gringa tatuada para os amigos caretas do escritório (...). Ok, ele era um cara bonito demais, louro, alto. Eu sentia meus joelhos amolecerem quando olhava aquele par de olhos verdes, aquele nariz fino e aquele sorrisinho canalha.
Mas, eis que naquela manhã de ressaca e gravata outra vez, perdi o medo do que estava por vir desde o começo. Comentei que ele "lucia muy bien" na fantasia de homen sério de todas as manhãs.
Mas, quem fala também ouve. E lá veio:
_Fantasia? Eu trabalho numa empresa 'séria'. Você está passeando, não é?
_Não, vim fazer um curso de Extensão em Cozinha. Mas, sim...estou me divertindo. Porque eu deveria me punir?
_Eu não disse isso. E você nem entenderia o que eu quero dizer. Mas, minha vida aqui é essa. Você viaja, tem uma profissão 'alternativa', como um músico. Meu irmão é músico, está no México. Mas eu ganho mais do que ele. Você escolheu cozinhar porque pode fazer isso em qualquer lugar enquanto for bonita. Você tem tudo que eu gosto, mas as coisas que eu gosto não me dariam estabilidade. E eu sou ariano, e RACIONAL.
_Wow, agora me chama de puta sem futuro. Prometo não esboçar qualquer nota de surpresa. - tentei ironizar, meu ódio ganhava vida própria. Eu poderia matá-lo sem remorsos naquele instante.
_Olha...Não somos iguais. Ponto. Você sai na rua agora com um casaco de leopardo, salto vermelho, unhas azuis e essa cara de stripper irresistível que você tem. E são 09am!!! Você entende? (eu entendia...)
Bom, a Maysa baixou em mim: meu mundo caiu. Ouvi outras também, que beleza morre com o tempo (eu já sabia), que tenho tantas qualidades incríveis(...),mas não sou pra CASAR.
E trust me: eu já casei. Mas, não com um cara que vestia terno e gravata pela manhã. Mas nem por isso doeu menos.
A verdade, quando confrontada, M-A-C-H-U-C-A.
Nos despedimos após o café, em frente meu apt. Ele desejou "boa viagem", e faltavam 2 semanas para meu retorno. Mas, para bom entendedor, meias mentiras bastam.
E diferenças são iguais. Ele não se encaixaria no meu mundo e nem eu no dele. Doeu, a constatação. Mas nada que um bar, amigos e outros drinks não resolvam.
Sim, queridinhos. Não sou sentimental o suficiente pra sofrer hoje como se não houvesse amanhã.
Dois dias depois, o conto era polonês. E nós brindamos com vinho...da Gato Negro.

..e cá estou no Brasil outra vez, planejando minha próxima parada. Mas, REFLITAM comigo: para todos os males existem passagens aéreas!

"Cachai"?

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Tuesday, November 15, 2011 - 02:28

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