Hoje, o céu é meu...

Esvazio a mente, deixo entrar a música e o corpo ondula desenhando a corrente de uma brisa de verão.
A cada batida do pé esqueço as cores artificiais e sinto a terra, o seu cheiro e as suas múltiplas combinações coloridas. Os braços esboçam os contornos das asas, as mãos hipnotizam com o movimento elegante das serpentes. Olhos semi-cerrados, sorriso prazeroso, não penso, danço.
A pista não é mais um círculo fechado repleto de gente. Os sons tribais que a enchem potenciam o transe a que me entrego. Não obstante, a escuridão não é completa.

Sinto-o a chegar e a descarga de adrenalina é inevitável. Senti-o como se uma pedra caísse no charco, criando o movimento, arrancando-me do abandono. Existem pessoas que afectam o ambiente, outras que captam essas sensíveis mudanças. Em alerta percorri o espaço. Esforçando-me na contra-corrente, procurei atingir a fonte. Na penumbra, ele sorria e os seus olhos atraíram os meus.

Por breves minutos voltei a ser uma chávena cheia. Muros ergui na breve tentativa de bloquear a luz e ofuscar a presença. Na verdade criava paredes com janelas que me permitiriam vê-lo sob a falsa ideia de protecção.

Dois passos arrastei na direcção no bar. Pedi uma gaiola para os meus impulsos, algo que travasse as pernas e que me colasse ao chão. Na verdade, o liquido que levei à boca desfez o açaime.

A Razão organizava, uma vez mais, a lista dos prós e contras. Ao recordar as minhas fugas e como o corpo lhe doera em todas as fantasias boicotadas, abandonou a tarefa a meio... Sem trela a vontade rugiu tomando posse, soltando vocábulos de puro desejo, eclipsando qualquer vislumbre de um Amanhã turbulento.

_ Vem! – Afirmo convicta da única solução para a minha fome.

Imaginem-vos dependentes de um alimento, raro, capaz de saciar a fome e a sede. Comparem-no a um oásis após uma penosa caminhada no deserto. Sombra, alimento e água ao alcance de um abraço… A fome ciente da privação é agreste, arrepia e crispa.

Sem esperar qualquer resposta fui para o exterior. A brisa marinha impregnada de música agita suavemente a superfície salgada. Instintivamente segui rumo à praia, deixando o meu rasto na areia prateada e silenciosa.
Os seus passos não tardaram a imprimir as vibrações que me assustam tanto quanto as desejo. Em resposta, a febre apodera-se, os olhos semicerram até sentir o veludo quente, a boca húmida, a língua sorridente. Abraço-o como se pudesse conter o Tempo, beijo-o como se pudesse criar um Presente Infinito.

Perfeitamente encaixada, assusto-me perante o sentimento de plenitude. Se mergulhar, se me deixar ir… Ao conhecer o Céu não terei eu uma maior noção do deserto em que vivo?

Hesito e hesitando preparo-me para uma nova fuga.
Como se adivinhasse, senti a pressão dos seus braços obrigando-me a fitá-lo. Sorriu e eu mergulhei no abismo dos seus olhos, de encontro à pele que nunca senti… Estremeci...

As mãos ondularam envolvendo-lhe o corpo na dança das serpentes, as línguas marcavam o ritmo. Parei para que me olhasse, enquanto alimentava as chamas do desejo. Ele arqueava e estremecia. Fechava os olhos e gemia. Sorria e os seus olhos eram o tecto da noite e todas as estrelas que esperava ver…

Quando a última peça de roupa planou até ao areal entrámos no mar prateado. As longas carícias prometiam um alívio em êxtase, os beijos confirmavam-no. Na união dos corpos, a carícia lunar resplandecia, sob a sua luz todos os sentidos eram igualmente amados.

Agora, era eu que fechava os olhos… Cerrava-os na incapacidade de conter as emoções que escapavam em suspiros alados. Harmonia e perturbação entrelaçavam-se no epicentro do prazer, criando ondas circulares de quente e frio. Incorporámos o movimento crescente da maré e sob o efeito da lua, na rebentação das ondas, entregámo-nos ao prazer que se sobrepõe a todas as coisas… Doce esquecimento…

Flutuo...
Desperto no céu e beijo-lhe a boca.

Amanhã não sei como será, mas hoje… Hoje, o céu é meu.

 

Publicado nos blogs: Olhar Joanna e na PEAPAZ

Submited by

Jueves, Agosto 11, 2011 - 13:09

Prosas :

Sin votos aún

Ema Moura

Imagen de Ema Moura
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 4 años 42 semanas
Integró: 03/15/2011
Posts:
Points: 317

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of Ema Moura

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Ministério da Poesia/Amor Nada mais (nona carta) 0 1.308 09/22/2014 - 17:54 Portuguese
Prosas/Contos «Pele...» 0 1.206 09/22/2014 - 17:52 Portuguese
Prosas/Erótico Proposta 0 1.488 09/22/2014 - 17:50 Portuguese
Poesia/Pensamientos Confissões de um conquistador 0 1.475 09/22/2014 - 17:47 Portuguese
Poesia/Pensamientos Pintura introspectiva 0 1.452 09/20/2014 - 10:19 Portuguese
Poesia/Pensamientos Silencia o teu amor 0 1.211 09/20/2014 - 10:17 Portuguese
Prosas/Pensamientos Monólogo da memória 0 1.127 09/20/2014 - 10:15 Portuguese
Poesia/Pasión Obsessão 0 1.358 09/20/2014 - 10:10 Portuguese
Poesia/Erótico Tortura, anseio... 1 1.351 01/27/2013 - 21:47 Portuguese
Prosas/Contos Inspira, relaxa e divaga... Suspira! 2 1.336 01/27/2013 - 16:40 Portuguese
Prosas/Erótico Outra vez! 2 2.069 01/27/2013 - 16:36 Portuguese
Poesia/Pasión Quero-te outra vez... 0 1.201 01/27/2013 - 16:08 Portuguese
Poesia/Amor Ouve-me 1 1.309 01/27/2013 - 15:50 Portuguese
Poesia/Erótico Amarro-te! 3 2.111 01/27/2013 - 15:45 Portuguese
Poesia/Meditación Ofélia 0 1.214 01/12/2013 - 22:34 Portuguese
Prosas/Contos Brilho 0 1.770 01/12/2013 - 22:20 Portuguese
Prosas/Contos Esculpidos na pedra 0 1.353 01/12/2013 - 22:15 Portuguese
Poesia/Amor Espero 0 1.519 01/12/2013 - 22:10 Portuguese
Prosas/Romance Hoje, o céu é meu... 0 1.549 08/11/2011 - 13:09 Portuguese
Poesia/Meditación Saudade poética 2 1.490 07/09/2011 - 01:59 Portuguese
Prosas/Erótico O desejo é muito mais que um brilho no olhar... 0 1.529 07/07/2011 - 22:17 Portuguese
Prosas/Erótico Tortura 0 1.403 07/07/2011 - 22:13 Portuguese
Prosas/Pensamientos Hoje 0 1.536 07/07/2011 - 22:06 Portuguese
Prosas/Erótico «Surpresa. Hoje é dia de pagamento!» 0 1.574 07/07/2011 - 21:59 Portuguese
Prosas/Erótico Saltos inquietos 0 1.464 07/07/2011 - 21:56 Portuguese