Copacabana 1945 - excertos (Paulo Mendes Campos)

I

As fichas finais do jogo
foram recolhidas; fecha-se
o cassino; abre-se em fogo

o coração que devora.
Vejo em vez de eternidade
no relógio minha hora.

E se quiser vejo a tua.
Às cinco tinhas encontro
num cotovelo de rua.

As cigarras do verão
tiniam quando sugavas
teu uísque com sifão.

Às onze no Wunder Bar
por meio acaso encontravas
a mulher que anda no ar.

Às três em Copacabana
uma torpeza uterina
pestana contra pestana.

As quatro e pouco saías,
comias um boi às cinco,
às seis e meia morrias.

Às duas ressuscitavas,
às cinco tinhas encontro,
às sete continuavas.

II

A mensagem abortada
de Copacabana perde-se
na viração: não é nada.

Morre um homem na polícia.
Tantos casos. Não é nada:
os jornais dão a notícia.

Uma criança que come
restos na lata de lixo
não é nada: mata a fome.

Não é nada. A favela
pega fogo. Não é nada:
faz-se um samba para ela.

Um moço mata a família
e se mata. Não é nada:
poupa o drama à tua filha.

Uma menina estuprada.
Uma virgem cai do céu.
Nada. Copacabanada.

VI

Copacabana, golfão
sexual: soma dois corpos
mas divide solidão.

VII

Pelas piscinas suspensas,
pelas gargantas dos galos,
pelas navalhas intensas,

pelas tardes comovidas,
pelos tamborins noturnos,
pelas pensões abatidas,

eu vou por onde vou; vou
pelas esquinas da treva:
Copacabana acabou.

Paulo Mendes Campos, (1922-1991), poeta, cronista e tradutor mineiro.

Submited by

Lunes, Abril 23, 2012 - 10:55

Poesia :

Su voto: Nada (1 vote)

AjAraujo

Imagen de AjAraujo
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 7 años 19 semanas
Integró: 10/29/2009
Posts:
Points: 15584

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of AjAraujo

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Videos/Musica Psalm! (Jan Garbarek) 0 10.057 09/02/2011 - 04:11 Inglés
Videos/Musica Litany, from Officium Novum Album (2010) (Jan Garbarek & The Hilliard Ensemble) 0 7.517 09/02/2011 - 03:55 Inglés
Videos/Musica Parce mihi Domine, from Cristóbal de Morales - 1500-1553 (Jan Garbarek & The Hilliard Ensemble) 0 11.436 09/02/2011 - 03:49 Inglés
Poesia/Amor Aceitar-te 0 3.794 09/02/2011 - 00:34 Portuguese
Poesia/Archivo de textos Álcool, carro, velocidade e o poder – uma combinação funesta! 0 6.021 09/01/2011 - 23:56 Portuguese
Poesia/Soneto A viagem 0 4.674 09/01/2011 - 21:37 Portuguese
Poesia/Amor A razão de ser da rosa 0 917 09/01/2011 - 21:33 Portuguese
Poesia/Amor À menina dos meus olhos 0 1.583 09/01/2011 - 21:30 Portuguese
Poesia/Amor A lua ressurge 0 1.457 09/01/2011 - 21:26 Portuguese
Poesia/Amor A dama e o cavaleiro 0 5.376 09/01/2011 - 21:21 Portuguese
Poesia/Amor Ausência (Jorge Luis Borges) 0 2.653 08/31/2011 - 16:25 Portuguese
Poesia/Fantasía Nostalgia do presente (Jorge Luis Borges) 0 4.132 08/31/2011 - 16:22 Portuguese
Poesia/Aforismo Um sonho (Jorge Luis Borges) 0 909 08/31/2011 - 16:20 Portuguese
Poesia/Aforismo Inferno, V, 129 (Jorge Luis Borges) 0 2.520 08/31/2011 - 16:18 Portuguese
Poesia/Dedicada Os Justos (Jorge Luis Borges) 0 3.376 08/31/2011 - 16:16 Portuguese
Poesia/Dedicada Longe (Cecília Meireles) 0 2.013 08/30/2011 - 21:54 Portuguese
Poesia/Intervención Desenho (Cecília Meireles) 0 3.101 08/30/2011 - 21:50 Portuguese
Poesia/Intervención Cantiguinha (Cecília Meireles) 0 1.008 08/30/2011 - 21:42 Portuguese
Poesia/Intervención Ó peso do coração!... (Cecília Meireles) 0 2.527 08/30/2011 - 21:40 Portuguese
Poesia/Amor Imagem (Cecília Meireles) 0 2.350 08/30/2011 - 21:29 Portuguese
Poesia/Archivo de textos Biografia: Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004), poetisa portuguesa 0 10.119 08/30/2011 - 11:41 Portuguese
Poesia/Aforismo Porque (Sophia de Mello Breyner) 0 967 08/30/2011 - 11:33 Portuguese
Poesia/Meditación Liberdade (Sophia de Mello Breyner) 0 2.364 08/30/2011 - 11:25 Portuguese
Poesia/Intervención Poesia (Sophia de Mello Breyner) 0 2.144 08/30/2011 - 11:22 Portuguese
Poesia/Dedicada Esta Gente (Sophia de Mello Breyner) 0 3.725 08/30/2011 - 11:19 Portuguese