A tempestade

A tempestade

Começa lentamente, sem fazer barulho, como uma chuva fina que toma aos poucos a cidade. Um murmúrio que pouco a pouco ocupa os espaços e seduz os ouvidos. Sem se dar conta de que o tempo passa e mesmo assim tudo parece estático, sem movimento, sem vida, apenas olhares fixos e fiéis, em vislumbrar o nada.

Existe alguns poucos que ao perceberem se levantam e caminham até a janela, apoiando no parapeito o que resta de dignidade e há quem diga é apenas mais um dia e continuam trocando passos com uma vida sofrida.

Mensageiros com palavras embriagadas que seduzem, pensamentos e objetivos que distorcem. Mentes que estão secas, não são capazes de manter a sanidade, tão pouco uma visão clara, pois a chuva, turva os olhos e a razão.

Erros que se repetem sem parar, sem pensar, muda-se os nomes, os motivos, troca-se símbolos mas a sede é a mesma, a vontade é a mesma e a luz temporária serve apenas para disfarçar a escuridão.

A chuva parece acalmar, saciar o ego de quem com um guarda-chuva, oferece abrigo, gestos sutis em forma de afago, para mostrar-se útil, deixando molhar apenas o que lhe convém. Escondendo sem que notem, a dependência que se forma, como um elo, entre vida e morte.

Em meio a tanto pensar… cala! Porque sabe que a palavra é mordaça, é arma para quem vive da força dos outros, para aqueles que ouvem a chuva e distorcem o trovão. A tempestade abafa as palavras, e sem elas acaba-se lentamente perdendo a sensatez.
O que era suave se torna agressivo, o que era apreciado, se torna motivo de medo, sem se dar conta, a água que traz consigo vida, também é capaz de causar morte.

Os becos começam a ter seus espaços tomados, pobres miseráveis a margem de tudo, são levados a força. O que antes refrescava, agora pela quantidade de lamentos que trazem consigo, destrói.

Os murmúrios da cidade, que cercada por barreiras mentais, apenas se enxergam  pichadas, palavras antes de ordem, mas agora com a realidade tomando as ruas, vilas e bairros, se tornam sem nexo. Frases que são levadas pelas águas, o que era esperança agora se torna caos.

Os corpos enrugados apodrecem lentamente, pois não é possível construir jangadas com ilusão, a festa que se fazia com o chuvisco agora é luto. Lentamente as vielas começam a secar, os prédios e árvores, castigados pela umidade começam a receber raios de luz.

Pessoas que se encontravam isoladas, sem noção do que acontecia, envolvidas pelo diluvio, aos poucos tomam as ruas. Os seres que vendiam as boas novas com a chegada da garoa, se encontravam acoados, dizendo não compreender a destruição causada.

Pessoas envolvidas antes pela seca, agora não desejavam mais sentir o sabor da abundante água. Os mensageiros ainda praguejavam suas doutrinas para que o vento ainda pudessem espalhá-las, em vão. Pois poucos desejavam se afogar em pequenos milagres que ouviram falar em velhas histórias.

Os livros e jornais não existiam mais, molhados acabaram perdendo a utilidade. Não havia registros do que aconteceu, tudo parecia aos poucos, uma lenda que se conta em conversas de terror. Mesmo que naquele momento, tais pessoas haviam compreendido que palavras suaves, não são capazes de compreender a dor.

Nunca mais se ouviu falar dos mensageiros, volta e meia algum visionário misturava palavras com o que aconteceu, tentando mostrar uma nova forma de saciar a sede. Em vão, pois corpos afogados apenas desejavam a dosagem certa.

Alguns murmúrios, soltos com o vento, correm as ruas insinuando que em algum outro lugar, ameaça ser tomado pela garoa que se torna tempestade. Mesmo que o tempo demonstre, algumas civilizações precisam passar pela ilusão. Para aprender a nadar é necessário não ter medo de se afogar.

Submited by

Jueves, Marzo 31, 2016 - 23:26

Críticas :

Sin votos aún

Pablo Gabriel

Imagen de Pablo Gabriel
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 4 años 12 semanas
Integró: 05/02/2011
Posts:
Points: 2944

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of Pablo Gabriel

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Poesia/Meditación Canto 0 2.302 09/23/2013 - 17:50 Portuguese
Poesia/Meditación Status 0 2.955 09/19/2013 - 16:41 Portuguese
Poesia/Meditación Ilusões 0 1.263 09/19/2013 - 14:21 Portuguese
Fotos/Otros Sobreviver 0 3.001 09/18/2013 - 17:24 Portuguese
Críticas/Varios A morte do galo 0 3.583 09/18/2013 - 13:56 Portuguese
Poesia/Meditación Quebra cabeça 1 1.943 09/17/2013 - 03:50 Portuguese
Fotos/Otros Vira-lata 0 2.602 09/16/2013 - 14:07 Portuguese
Fotos/Otros Final 0 7.294 09/14/2013 - 14:27 Portuguese
Fotos/Otros Gado 0 4.462 09/13/2013 - 15:34 Portuguese
Poesia/Meditación Politica 0 2.472 09/13/2013 - 14:21 Portuguese
Poesia/Meditación Outros tempos 0 2.356 09/12/2013 - 16:27 Portuguese
Poesia/Meditación Moribundos 0 2.046 09/11/2013 - 21:54 Portuguese
Fotos/Otros Porta 0 2.890 09/10/2013 - 13:23 Portuguese
Fotos/Otros Miséria 0 3.056 09/10/2013 - 12:42 Portuguese
Críticas/Varios A violência organizada 0 2.877 09/09/2013 - 14:15 Portuguese
Poesia/Meditación Sentir a verdade 0 1.886 09/06/2013 - 18:47 Portuguese
Poesia/General Cruza, cruzes, com a sorte! 0 3.108 09/05/2013 - 21:34 Portuguese
Poesia/Meditación Dez por cento 0 1.980 09/05/2013 - 18:00 Portuguese
Poesia/Meditación O governo 0 2.098 09/05/2013 - 16:20 Portuguese
Poesia/Alegria Os pássaros 0 2.267 09/02/2013 - 22:10 Portuguese
Poesia/Meditación Alento 0 3.041 08/26/2013 - 18:59 Portuguese
Poesia/Pensamientos Olhares 0 1.941 08/26/2013 - 18:17 Portuguese
Fotos/Otros As pessoas 0 4.978 08/23/2013 - 17:18 Portuguese
Poesia/Meditación Por merecer 0 1.754 08/23/2013 - 14:39 Portuguese
Fotos/Otros Perfil 0 7.298 08/19/2013 - 18:37 Portuguese