Arte Poética - Capítulo XVII
Conselhos aos poetas sobre a composição das tragédias
Quando o poeta organiza as fábulas e completa sua obra compondo a elocução das personagens, deve, na medida do possível, proceder como se ela decorresse diante de seus olhos, pois, vendo as coisas plenamente iluminadas, como se estivesse presente, encontrará o que convém, e não lhe escapará nenhum pormenor contrário ao efeito que pretende produzir.
2. A prova está nesta crítica feita a Cárnico<1>:Anfiarau<2> saía do templo; escapou este pormenor ao poeta, porque não olhava a cena como espectador, mas foi o bastante para a peça cair no desagrado, pois os espectadores se indignaram.
3. Na medida do possível, é importante igualmente completar o efeito do que se diz pelas atitudes das personagens. Em virtude da nossa natureza comum, são mais ouvidos os poetas que vivem as mesmas paixões de suas personagens; o que está mais violentamente agitado provoca nos outros a excitação, da mesma forma que suscita a ira aquele que melhor a sabe sentir.
4. Por isso a poesia exige ânimos bem dotados ou capazes de se entusiasmarem: os primeiros têm facilidade em moldar seus caracteres, não sentem dificuldade em se deixarem arrebatar.
5. Quanto aos assuntos, quer tenham sido já tratados por outros, quer o poeta os invente, convém que ele primeiro faça dos mesmos uma idéia global, e que em seguida distinga os episódios e os desenvolva.
6. Eis o que entendo por "fazer uma idéia global": por exemplo, a propósito de Ifigênia. Uma donzela, prestes a ser degolada durante um sacrifício, foi tirada dos sacrificadores, sem estes darem pelo fato; e transportada a outra região onde uma lei ordenava que os estrangeiros fossem imolados à deusa; e a donzela foi investida nesta função sacerdotal. Passado algum tempo, o irmão da sacerdotisa chega àquela região, e isto ocorre porque o oráculo do deus lhe prescrevera que se dirigisse àquele lugar, por motivo alheio à história e ao entrecho dramático da mesma. Chegando lá, ele é feito prisioneiro; mas quando ia ser sacrificado, deu-se a conhecer (quer como explica Eurípides, quer segundo a concepção de Políido, declarando naturalmente que não somente ele, mas também sua irmã devia ser oferecida em sacrifício) e com estas palavras se salvou.
7. Após isto, e uma vez atribuídos nomes às personagens,
8. importa tratar os episódios, tendo o cuidado de bem os entrosar no assunto, como, no caso de Orestes, a crise de loucura, que provocou sua prisão, e o plano de purificá-lo, que causou sua salvação.
9. Nos poemas dramáticos os episódios são breves, mas baseando-se neles, a epopéia assume proporções maiores.
10. De fato, o assunto da Odisséia é de curtas dimensões. Um homem afastado de sua pátria pelo espaço de longos anos e vigiado de perto por Poseidon acaba por se encontrar sozinho; sucede, além disso, que em sua casa os bens vão sendo consumidos por pretendentes que ainda por cima armam ciladas ao filho deste herói; depois de acossado por muitas tempestades, ele regressa ao lar, dá-se a conhecer a algumas pessoas, ataca e mata os adversários e assim consegue salvar-se. Eis o essencial do assunto. Tudo o mais são episódios.
Notas
1. ↑ Autor desconhecido.
2. ↑ Adivinho célebre, viajou com os argonautas. Sua mulher, Erífila, seduzida pelo feitiço de um colar, descobriu o esconderijo onde ele estava, pois não queria participar da guerra contra Tebas. Aclméon, filho deles, apunhalou a própria mãe por vingança por haver esta descoberto o ardil de Anfiarau.
Submited by
Poesia Consagrada :
- Inicie sesión para enviar comentarios
- 1609 reads
other contents of Aristoteles
Tema | Título | Respuestas | Lecturas | Último envío | Idioma | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia Consagrada/Biografía | Aristóteles Biografia | 0 | 876 | 05/14/2011 - 15:18 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Biografía | Aristóteles Biografía | 0 | 3.333 | 05/14/2011 - 15:17 | Español | |
Poesia Consagrada/Biografía | Aristotle Biography | 0 | 753 | 05/14/2011 - 15:14 | Inglés | |
Fotos/Perfil | Aristoteles | 0 | 852 | 11/24/2010 - 00:37 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XXI | 0 | 1.360 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XXII | 0 | 1.398 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XXIII | 0 | 1.380 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XXIV | 0 | 1.310 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XXV | 0 | 1.472 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XXVI | 0 | 1.570 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XXVII | 0 | 1.443 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo VII | 0 | 605 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo VIII | 0 | 665 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo IX | 0 | 821 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética -Capítulo X | 0 | 513 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XI | 0 | 1.342 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XII | 0 | 1.328 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XIII | 0 | 1.177 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XIV | 0 | 1.303 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XV | 0 | 1.403 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XVI | 0 | 1.080 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XVII | 0 | 1.609 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XVIII | 0 | 1.356 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XIX | 0 | 1.197 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Filosofía | Arte Poética - Capítulo XX | 0 | 1.437 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese |
Add comment