Se temos o poder de criar, se nos fazem felizes o céu e a eternidade... Porque não?

Observo o transeunte. A sua corrida compenetrada, o seu stress, a sua preocupação, a sua consciência - Corre.

Corre para algo que lhe é tão vital e tão inútil.

Compromissos a cumprir, honra a defender, imagem a construir, lar a sustentar, vida a garantir, felicidade a atingir.

Luta desenfreado e a cada objectivo alcançado, logo outro se pré-figura mais adiante.

A satisfação encontra-a na ilusão da realização daquele objectivo proposto ou que se propôs. Satisfá-lo caminhar no encalço. Satisfá-lo o vencimento das etapas que se sucedem.

Atingido o objectivo, porém, a satisfação desvanece-se. Apenas um breve orgulho de vitória o regozija. Breve, porque logo, logo, verifica que apenas venceu uma obrigação, apenas fez o que se esperava que fizesse. Agora, lá no horizonte, a vida clama outra vez por ele. Lá à frente, incorporada noutro objectivo, noutra obrigação criada, noutra necessidade inventada, impele-o a continuar.

Pergunta-se porquê. Para que corre ele; para onde vai.

Respondo-lhe que apenas se cumpre. Respondo-lhe que esse universo, essa teia de compromissos, a sua consciência atormentada, são a razão porque se diz vivo.
São a sua própria vida, o sustento do seu ser, a certeza do seu eu.
Congregam uma energia vital feita da conjugação de uma miríade de factores extrínsecos e intrínsecos, nos quais realiza a sua identidade.

Quando o seu corpo se consumir, quando morrer, essa energia dissipar-se-á - a desintegração do seu ser tal como é, será inevitável. Persista o que persistir, o seu Eu jamais será. Essa consciência de si diluir-se-á no tempo.

O espírito poderá ser etéreo ou eterno, mas eu não o sou com toda a certeza. Este espírito, esta alma, estas linhas... São minhas. Mas é tão certo isto, que sou tão Eu, quanto certo é que desintegrada a minha humanidade, desaparecerei.

Não mais viverei. Não mais sentirei enquanto Eu. Serei outra coisa, outro quem - simplesmente matéria ou composta matéria - O que for. Não serei mais Eu.

Existirei talvez. Sem vida, vogarei porventura na memória de alguns. Mas ser-me-á então indiferente, pelo simples facto de que não vivo.

Esse Eu que, dizem, estará no céu, não serei Eu. Esse, Eu que permanecerá na memória do Mundo não serei eu.

O eu é finito. É o lampejar de luz no candeeiro, que irremediavelmente se apaga quando a lâmpada se funde.

A electricidade, a energia, ou a vida, continuará ali - troque-se a lâmpada e a luz reviverá. Mas a lâmpada inicial... essa, não mais tornará.

O meu Eu, o teu Eu, são a lâmpada. A electricidade está lá, mantém-se, mas a luz...
A existência é como a electricidade - está lá sempre, a vida é que não.
Que há de extraordinário nisto afinal? Porque teimarmos em cindir a vida da existência'
Faz-nos mais felizes isso de sabermos que nos apagamos e pronto?

Não, isso angustia-nos. Rouba-nos felicidade, atormenta-nos e faz-nos morrer vivos.

Por isso, digo:
Esqueçamo-nos disso. Inventemos, arroguemo-nos o direito à criação, sejamos felizes. Que diabo, que há de mal nisso?

Viva vida, viva a criação, viva a eternidade, os santos, os anjos, Deus e tudo mais que queiramos.
 

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Domingo, Febrero 27, 2011 - 11:18

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miguelmancellos

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Adorei o seu texto.Muito bom;

Adorei o seu texto.Muito bom; muito entendimento repartido pela criação dos momentos mais lindos; onde, a felicidade, incita, ao caminhar das coisas mais simples.

Parabéns. PALMAS!

A eternidade é a procura satisfatória.

Grande abraço.

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