Uma Vontade

Longe vão os dias em que brincávamos como crianças (em nós apenas duraram três ciclos lunares).
A fragilidade do que construímos resistiu apenas por Uma vontade. Agora os pés estão doridos e tem feridas abertas pelos cacos que pisa.
Uma Vontade está frágil, a outra, sua parceira, é instável, como sempre.
A relatividade do Ser e da Acção torna amargo todo e qualquer esforço. O que Uma Vontade aguentou em duas décadas, a outra não aguenta dois dias. Nunca aguentou.
Ainda assim, Uma Vontade deixou-se ficar, procurou nos sonhos a bolha de ar de que precisava para acordar e prosseguir na realidade estranguladora. Respiraria quando adormecesse, entretanto, a vida era um enorme suspender do ar. Resistência.
Uma Vontade serviu como era preciso, montou o cenário, criou a história e encantava a serpente.
A serpente que se mantinha enrolada no seu corpo. A serpente que lhe enchia as gavetas de adereços e enfeites para que Uma Vontade criasse nova histórias. Novas histórias que nunca chegavam ao fim. Uma Vontade sabia contar histórias e o apetite da serpente aumentava ferozmente. A história era interrompida abruptamente, o tecido caía rasgado... Horas depois, o corpo de Uma Vontade caía encharcado pelos fluidos de uma serpente cega no seu próprio desejo.
Uma Vontade corrompeu-se e hoje não se reconhece quando se olha ao espelho e nem quando ouve os seus pensamentos.
A serpente força-a, mas a boca não se abre, apenas o corpo. Uma Vontade está vazia, não tem histórias para contar!
O Presente e o Futuro são tomados pela incerteza. Uma Vontade está recolhida num movimento de destruição. Leva à boca o líquido que a envia para um sono profundo, sem sonhos, sem bolha de ar.
Cada dia que passa aumenta a dose necessária. Procura alívio na dormência. Abafa qualquer história que ainda saiba. A serpente não pode saber que Uma Vontade ainda tem histórias para contar.
Uma Vontade dá o passo em frente e mergulha no infinito.
A serpente não gosta e se não gosta irá finalmente embora. O que Uma Vontade aguentou em duas décadas, a outra não aguenta dois dias. Nunca aguentou.

Acordo com dor e na memória um pesadelo recorrente.
Sei o que temo e sei o que tenho de mudar.
Saber apenas torna o dia-a-dia mais penoso. 

Submited by

Viernes, Marzo 18, 2011 - 13:57

Prosas :

Sin votos aún

Ema Moura

Imagen de Ema Moura
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 4 años 42 semanas
Integró: 03/15/2011
Posts:
Points: 317

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of Ema Moura

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Ministério da Poesia/Amor A minha origem e o meu fim! 0 448 03/15/2011 - 00:52 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor Se não escrevo 0 432 03/15/2011 - 10:13 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor E o impossível acontece 0 536 03/15/2011 - 10:20 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Desejo Febril 0 594 03/15/2011 - 10:30 Portuguese
Ministério da Poesia/Intervención Fome doentia 0 584 03/15/2011 - 10:33 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor Confesso 0 484 03/15/2011 - 10:36 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor Tenho-te! 0 432 03/15/2011 - 10:44 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor Na tua boca... 0 457 03/15/2011 - 10:47 Portuguese
Ministério da Poesia/Erótico Jamais partir 0 496 03/15/2011 - 10:53 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor Na terra do impossível 0 431 03/15/2011 - 10:58 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor A verdade incómoda 0 446 03/15/2011 - 11:02 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Perco-me 0 544 03/15/2011 - 11:06 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Agarra-me! 0 566 03/15/2011 - 11:08 Portuguese
Ministério da Poesia/Intervención Queria ser livre 0 496 03/15/2011 - 11:12 Portuguese
Ministério da Poesia/Dedicada Essência 0 626 03/15/2011 - 11:15 Portuguese
Ministério da Poesia/Erótico Promete 0 982 03/15/2011 - 11:19 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Reflexos da Alma 0 585 03/15/2011 - 11:22 Portuguese
Ministério da Poesia/Desilusión Mastigo-te! 0 562 03/15/2011 - 11:26 Portuguese
Ministério da Poesia/Desilusión Livre 0 577 03/15/2011 - 11:28 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Exalar 0 554 03/15/2011 - 11:34 Portuguese
Ministério da Poesia/Desilusión Claramente 0 671 03/15/2011 - 14:16 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor Porque mereço... 0 512 03/15/2011 - 14:19 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Insanidade 0 505 03/15/2011 - 14:22 Portuguese
Ministério da Poesia/Intervención Em queda livre 0 599 03/15/2011 - 14:50 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Meu vício 0 503 03/15/2011 - 14:53 Portuguese