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A sedução de Carmilla

Entre as clássicas histórias de vampiro, Carmilla, publicada primeiro como folhetim na revista Dark Blue, de 1871 a 1872 pelo irlandês Joseph Thomas Sheridan Le Fanu, merece ser mencionada por ter lançado elementos que até hoje fazem parte da mitologia vampírica, como a densa carga erótica e a célebre estaca no coração. Tendo sido escrita antes do Drácula de Bram Stoker, Carmilla, a vampira de Karnstein, serviu obviamente de inspiração a esse primeiro e chama a atenção por ter uma vampira como o personagem central. 
A história se passa na Estíria, lugar isolado do Leste Europeu, sendo narrada em primeira pessoa por Laura, jovem que conta sobre episódios singulares ocorridos anos atrás na sua vida, os quais ainda lhe despertam vívidas lembranças.
Voltando no tempo, Laura vai falando de sua infância  como filha única de um senhor de um castelo localizado em lugar ermo. Mimada e protegida, Laura levava uma existência bastante tranquila até que, uma noite, despertando subitamente, ela vê uma bela e misteriosa mulher ao seu lado. A mulher se deita junto dela na cama e Laura cai novamente no sono, para despertar com a sensação de duas agulhas perfurando seu peito. Apavorada, a menina grita, chamando a atenção dos outros moradores, que tentam tranquilizá-la, assegurando-lhe que tudo não passou de um pesadelo.
Durante anos, Laura mantém dentro dela as impressões causadas pelo estranho incidente e, certa noite, passeando com o pai, ela avista uma carruagem, a qual se acidenta. Imediatamente, saem de dentro do meio de transporte uma senhora e sua filha, aparentemente ferida. A estranha mulher diz que precisa viajar para tratar de negócios urgentes e está desesperada porque não tem com quem deixar a filha. Acaba por suplicar ao pai de Laura que cuide de sua filha até o seu regresso daqui a três meses e ainda lhe faz o misterioso pedido de que nunca pergunte á jovem sobre aspectos particulares de sua vida, partindo apressadamente.
A jovem é conduzida a um quarto no castelo e Laura, curiosa, vai vê-la, descobrindo que a linda e encantadora hóspede é extraordinariamente parecida com a jovem com quem ela sonhou anos atrás. A hóspede, ao ver Laura, afirma que também sonhou com ela quando criança e parece fascinada por ele, assim como Laura se sente estranhamente atraída pela visitante.
Com o tempo, Laura vai se aproximando da bela hóspede, que revela se chamar Carmilla e é, ao mesmo tempo, insinuante e esquiva, nunca revelando nada de si mesma e se movendo lânguida e lentamente, o que intriga Laura, pois a sua aparência saudável não combina com a lentidão de seus movimentos, que sugerem um cansaço permanente.
Outras singularidades de Carmilla são o fato dela só levantar à tarde, não comer, não rezar ou falar em religião, trancar-se no quarto e se dirigir a Laura com gestos típicos de um rapaz apaixonado, dizendo que ambas serão "uma só". Tais atitudes repugnam e ao mesmo tempo enleiam Laura, deixando-a sem ação.
Enquanto Carmilla vai ficando no castelo, fatos estranhos ocorrem: duas jovens do povoado morrem de uma enfermidade inexplicável e, um dia, o pai de Laura recebe um quadro restaurado de uma condessa Mircalla, da extinta estirpe dos Karnstein. Laura se impressiona ao perceber a incrível semelhança física entre Carmilla e a condessa, morta há mais de cem anos.
Logo, Laura vai sofrendo inexplicável transformação. Todas as noites, tem sonhos estranhos, sente que alguém entra no seu quarto e agulhas finas são penetradas em sua garganta e vai definhando devagar á medida que o tempo passa. Curiosamente, Carmilla se aproxima mais dela e Laura, embora fraca, acha prazerosa a sensação que dela se apodera.
No desenrolar da história, vamos tomando contato com os elementos do folclore europeu, os quais provavelmente Sheridan Le Fanu estudou para compor sua obra e com fatores que influenciaram o mito vampírico para a posteridade, como o fato do vampiro sempre usar um anagrama do seu próprio nome, reordenando as letras, como podemos constatar ao ver os três nomes usados pela vampira: Carmilla, Millarca e Mircalla. Entre  outros fatores interessantes a ser observados está a sedução. O vampiro seduz sua vítima, minando-lhe a resistência e, ao mordê-la, causa-lhe prazer e lhe esvai a vida. Laura enfraquece e se deleita. Nesta passagem, podemos ver o prazer sexual que equivale à morte.
Carmilla, escrita no século XIX, inova ao apresentar uma vampira fazendo o que nossa imaginação concebe como papel reservado aos vampiros do sexo masculino: sedução e dominação de suas inocentes vítimas. Neste ponto, ela rompe com o patriarcado, mostrando também um lado da psique feminina que era um verdadeiro tabu para a época: o desejo sexual. Como vampira, ela não está sujeita ás convenções que regem o mundo dos vivos, seguindo seus próprios instintos.
Pode-se dizer que Carmilla rompe com o papel normalmente reservado às mulheres da época, que tinham de ser obrigatoriamente seres inocentes e angelicais. Visitando-as à noite, na penumbra dos seus quartos, ela não lhes rouba apenas o sangue, isto é, a vida. Rouba também suas inocências, apresentando-lhes o prazer, o desejo e a liberdade sexual.
Talvez Carmilla simbolize a sexualidade reprimida da própria Laura. Laura é loura de olhos azuis e as louras costumam ser associadas aos anjos, à pureza. Carmilla, por sua vez, tem cabelos e olhos escuros, o que condiz mais com sua condição de ser misterioso. Laura poderia ser o ying e Carmilla, o yang, o claro e o escuro, a jovem inocente e a mulher sexualmente livre, o que nos leva a refletir que Carmilla pode ser o duplo de Laura. 
Uma das características mais marcantes de Carmilla é seu lesbianismo assumido, uma ousadia naquele tempo.
Assumindo-se apaixonada por Laura, ela revoluciona ao tomar uma atitude considerada própria de um homem, inovando também ao admitir que uma mulher, não um homem, é o objeto do seu desejo e paixão, mostrando a possibilidade de uma existência onde os homens são desnecessários, portanto, descartáveis.
Com sua atmosfera sugestiva, narrativa que prende a atenção, elementos do folclore europeu e características ousadas para o tempo em que foi escrito e publicado, Carmilla, a vampira de Karnstein, ajudou a sedimentar e popularizar a imagem do vampiro, sendo assim uma obra clássica que merece ser lida e relida.

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sexta-feira, maio 1, 2015 - 09:20

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