CONCURSOS:

Edite o seu Livro! A corpos editora edita todos os géneros literários. Clique aqui.
Quer editar o seu livro de Poesia?  Clique aqui.
Procuram-se modelos para as nossas capas! Clique aqui.
Procuram-se atores e atrizes! Clique aqui.

 

Bairro do fim do mundo

Na entrada do jardim iniciava o princípio do mundo.
O recorte dos canteiros, ensombravam meios metros de calçada, que desalinhavam em redondos, um xadrez de pedras pretas e brancas que se encovavam com a erosão e se fechavam em labirintos geométricos.
No princípio do mundo, erguiam-se eucaliptos que elevavam copas sombrias e reflectiam em desenhos brisas gentis.
Rumores de ventos e sois, a concluir a fotossíntese das coroas concertadas de amarelos, vermelhos e violetas, que compunham em harmonia o palco de um teatro de insectos e pombos que bebiam água no lago.
Sobre umas mesas que tinham sido plantadas antes do sol me ser luz, o adorno dos tampos em cimento contavam histórias sem meada de pássaros que voavam estáticos em gaiolas de ladrilho que jogavam dominó com os velhos em espera…
O princípio do mundo acabava onde começava o fim do mundo.
Criei-me entre o jardim do princípio e o bairro do fim.
Sempre assimilei com discrição e silêncios, o que era assimétrico entre a serenidade dos pássaros em canto livre do meu jardim sonolento e o frenesim que embarrancava apelos e gritos no bairro do fim do mundo.
Era me estranho e novo de cada vez que a bola chutada com auxilio da brisa e dos apelos, transpunha o jardim e eu me encontrava de corpo crescido a extasiar entre barracas e pobres quase que fascinado com a miséria do mundo envolto em poeira.
Como que por magia, ou assuntos mal resolvidos com a noção do destino, apareciam atrás da bola crianças crescidas que ficavam num deambulo hipnótico a jogar no meio do pó.
Começamos, primeiro por acidente a ir buscar a bola…
Depois, apareceram mais crianças para jogar, o jardim tornou-se pequeno no dominó que embrutecia os dias em espera…
Os pássaros, os velhos, a calçada em xadrez e a fotossíntese da vida, esmoreceram…
O princípio do mundo ficou vazio.
No fim do mundo, encontrava-se de toda a gente…os betos de Cascais impressionados com a adrenalina provocada por jogar na poeira e fartos da rotina que enchia o verão nos seus vagares burgueses, entre a Rua Direita e a Baía a olhar o mar,
as queridas “avant-gard” da linha que habitavam em apartamentos classe média alta, em Oeiras ou Paço de Arcos , os pescadores de Caxias que assobiavam com o cigarro na boca ladainhas imperceptíveis que só os ciganos do bairro entendiam, filhos de empresários do Estoril, empresários do Estoril e uma mescla de liceais e vadios, que davam vida ao fim do mundo e sentido ao jogo.
O fim do mundo era uma espécie de Casbah da linha, dada a delírios consumistas que enfeitavam as almas de cores…castanha e branca.
Não havia noite nem dia no fim do mundo e as crianças crescidas já não dormiam nem paravam no jardim.
O jogo não parava, não cansava, não amávamos, não riamos, não chorávamos, não falávamos…jogávamos e jogávamos, lesionados, com os braços em ferida, com os pés inchados, com a barriga vazia e a morte ao lado, os ciganos a gritar, suplentes a vomitar, as betas possuídas as queridas que se vendiam, os empresários empobrecidos, o bairro entristecido carregado de mortos vivos…que não jogavam dominó!
A praia ali em baixo…e o meu jardim vazio.
Estou agora sentado…
A entrada do jardim inicia o princípio do mundo.
O recorte dos canteiros, ensombram meios metros de calçada, que desalinham em redondos, um xadrez de pedras pretas e brancas que se encovam com a erosão e se fecham em labirintos geométricos.
No princípio do mundo, erguem-se eucaliptos que elevam copas sombrias e reflectem em desenhos brisas gentis.
Rumores de ventos e sois, a concluir a fotossíntese das coroas concertadas de amarelos, vermelhos e violetas, que compõem em harmonia o palco de um teatro de insectos e pombos que bebem água no lago.
Sobre umas mesas que foram plantadas antes do sol me ser luz, o adorno dos tampos em cimento contam histórias sem meada de pássaros que voam estáticos em gaiolas de ladrilho que jogam dominó com os velhos em espera…
Tem de haver o momento em paramos de jogar.
Há o momento que paramos de jogar.
Estou de novo sentado no jardim…há mais de uma década que tento aprender o dominó...sem nunca aprender!
Já não levo a bola...
Mas sempre que vejo uma criança a crescer, para chutar com força…Corro a agarra-la.
Para que possa correr pelas alamedas da vida, sem nunca se perder na poeira dos dias.
Nos bairros do fim do mundo...empoeirados pela tristeza.

Submited by

quinta-feira, abril 1, 2010 - 23:54

Poesia :

No votes yet

Lapis-Lazuli

imagem de Lapis-Lazuli
Offline
Título: Membro
Última vez online: há 11 anos 1 semana
Membro desde: 01/12/2010
Conteúdos:
Pontos: 1178

Comentários

imagem de Henrique

Re: Bairro do fim do mundo

Bom poema!!!

:-)

imagem de cecilia

Re: Bairro do fim do mundo

Amigo poeta, a cada frase que leio perco-me nas mil interpretações fantásticas a qual viajo em meditação.
O jogo da vida sempre nos levará ao fim do mundo, cabe a nós transforma-la em jardim florido ou pó.

Favoritos nele.

Beijos
Cecilia Iacona

imagem de robsondesouza

Re: Bairro do fim do mundo

Lindo texto!!

Entre o jardim do ínicio e o bairro do fim há um grande poeta!

Abraços, Robson!

imagem de vitor

Re: Bairro do fim do mundo

Este texto poético é simplesmente fabuloso meu caro Lapis-Lazuli!
Tem tudo.Forma poética, prosa corrente, conteúdo, tudo o que um grande autor faz quando ganha um Óscar.
Claro, por vezes não acontece porque o júri está viciado.
Gostei muito.
Abraço.

Vitor.

Add comment

Se logue para poder enviar comentários

other contents of Lapis-Lazuli

Tópico Título Respostas Views Last Postícone de ordenação Língua
Poesia/Pensamentos Os nossos olhos combinam 1 899 07/11/2010 - 02:20 Português
Poesia/Aforismo Cheiro um adeus cobarde 2 1.225 07/03/2010 - 23:04 Português
Poesia/Aforismo Queira deus palmeiras verdes 2 854 07/01/2010 - 15:23 Português
Poesia/Pensamentos Duo das almas em fuga 3 1.078 06/26/2010 - 16:41 Português
Poesia/Pensamentos Quando morreres o amar 2 933 06/26/2010 - 15:35 Português
Poesia/Amor Só em muito silencio... 9 744 06/24/2010 - 10:09 Português
Poesia/Paixão Ouve-me 4 1.083 06/16/2010 - 23:21 Português
Poesia/Intervenção O punho dos inválidos 1 970 06/15/2010 - 22:15 Português
Poesia/Amor Condão 3 875 06/10/2010 - 10:37 Português
Poesia/Amor Partilha-te 3 858 06/09/2010 - 13:16 Português
Poesia/Intervenção Greve Geral 2 969 05/31/2010 - 01:05 Português
Poesia/Dedicado Poetas Imorais (dedicadinho) 6 1.513 05/25/2010 - 01:02 Português
Poesia/Aforismo Quanto mais conheço os homens... 1 2.804 05/19/2010 - 02:29 Português
Poesia/Dedicado Morre Marta... 1 1.335 05/19/2010 - 01:33 Português
Poesia/Aforismo Sem penas para voar 4 894 05/17/2010 - 15:46 Português
Poesia/Amor My lady blues 1 1.019 05/17/2010 - 01:54 Português
Poesia/Aforismo Maio 1 1.366 05/15/2010 - 03:55 Português
Poesia/Amor Acho que a paixão foi dormir 4 1.081 05/13/2010 - 20:47 Português
Poesia/Aforismo Assimétricos 1 985 05/12/2010 - 20:51 Português
Poesia/Dedicado Ao Ary...Camarada e Poeta 1 986 05/10/2010 - 08:53 Português
Poesia/Aforismo A cara dos outros 2 878 05/09/2010 - 22:35 Português
Poesia/Pensamentos Alegoria dos ausentes 1 1.017 05/09/2010 - 19:02 Português
Poesia/Pensamentos Reminiscências pontos e reticências 7 1.411 05/08/2010 - 14:14 Português
Poesia/Aforismo Eu sei voar 5 960 05/08/2010 - 04:22 Português
Poesia/Meditação Letra infinita 1 837 05/06/2010 - 21:33 Português