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Viagem
Pirinéus 1989
Estamos os dois que já só um,
A fumar uma névoa louca.
As montanhas cobertas de neve são o manto da nossa calma…
Somos eternos…
Algum dia nestes caminhos passeará em verso o tempo.
Estamos nesta fronteira que vai ser nossa para sempre.
Nem posso acreditar no que está para vir…
Lisboa anos 90
Chegou-me á boca o sabor.
Agora muito baixinho,
Que tenho universos aturdidos
A zunir e a adormecer…
Não há palcos nem actores só eu durmo na estação.
Mil cadáveres em fila numa sinfonia de calares…
Qual de vós vai estar presente,
Quando o vómito arrojar o sangue alucinado da última agonia?
Não sinto…sinto tudo…
Este amor assassino tatuado pelos braços,
Estradas que nunca me levam para onde começou,
A derrocada miserável do meio homem que sou.
…“Passa a noite num navio”…
Outubro 2001…
Estou sentado no terminal de autocarros de Salamanca.
O frio é cortante e tenho um Cartão de vinho comprado com pesetas mendigadas.
Há um cão…
Choro este lixo mal vestido de azul, enquanto componho chamadas saldadas ao destino que atendo a inventar esperanças.
Estou no fim de mim.
Por certo morrerei sentado se não atender á minha chamada.
Estou…Estou…
Estou, sem frio.
Deixei os pés na estrada e enchi a alma do que era último.
Foi este querer fascinar-me que brilhou para não ser fim.
Uma estranha compaixão de me terem absoluto, sem longitudes nem fronteiras, e sem a neve dos Pirinéus.
Adivinhei o que já sabia…Deus não passa de uma finta rústica a dar-nos palmadas nas costas.
Outubro 2001
Miranda do Douro…
Aninho no autocarro com um consentimento de glória.
A incerteza que sou é uma força imparável.
Vejo as estradas nos braços e desvendo os caminhos, os teus olhos estão tão perto que choras as minhas lágrimas.
Desta, não há desta vez.
Mirandela, Mogadouro, Vila Real, Porto, não vai parar…
E Coimbra esqueceu-se das pedras de Amesterdão, o comboio bufa milhas já longe de Charleroi, deixei um corpo morto numa casa de banho em Génova e esqueço tudo num repente nos edifícios de Brigthon, esqueço-me a lembrar passados de onde estive e nunca fui…desta vez não há paragens que me desviem dos teus olhos…
Como é bom voltar para casa.
Março 2009
Lisboa
Já estou aqui há tanto tempo…
Sabes o que mais me custou?
Tudo…nada…
Precisava ser assim para não crer em impossíveis.
Amo-te.
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Comentários
Re: Viagem
Uma palavra: Gostei
Carla
Re: Viagem
Mais q um registo em forma de diário, ou até mesmo notas brilhantes ao estilo de carta, (seja mental ou escrita, a meu ver ambas as coisas)... O seu poema imprime uma beleza comovente e torturante, ao sentimento do desencontro q se mantém sempre encontro porque a pertença nunca se perde... Gosto de o ler, muito até!
Beijinho em si
Inês
Re: Viagem
Belo e longo poema.
Gostei.
Um abraço,
REF