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A amizade…. E… a fidelidade!

A amizade…. E… a fidelidade!

Carracento, Perdido, Vadio, etc. eram os nomes que numa esquecida aldeia encravada na Serra da Estrela davam a um cão, animal de grande porte, fruto do cruzamento de várias raças, que costumava passar no rasto de um grande rebanho de ovelhas, que percorria a serra em busca de melhores pastos.

Sendo um animal vadio, era sempre acusado, nas suas passagens, de todos os desaparecimentos de animais domésticos, pelo que era afastado pela garotada que alegremente lhe atirava pedras.

Um dia, no início da Primavera, o grande rebanho cumpriu a sua rotina e passou junto à aldeia. Centenas e centenas de ovelhas que se anunciavam com o cantar dos seus chocalhos, sempre atentamente vigiadas pelos pastores e pelos cães de guarda, que farejavam em busca do odor dos naturais predadores, os poderosos e esfaimados lobos, que ansiosos aguardavam a chegada do seu maná.

Como era seu hábito, sempre muito afastado do rebanho, Carracento surgiu, magríssimo, de andar pesado da sua fraqueza e completamente infestado por carraças e pulgas.

De imediato foi a alegria da garotada, que o atacou encarniçadamente com as suas fisgas, forçando-o a procurar refúgio, que apenas encontrou no quintal da casa mais afastada da aldeia e abrigo de uma modesta família, um idoso casal que criava o seu neto, uma criança de seta anitos, a padecer de uma grave doença que lentamente lhe consumia a visão.

João, o menino, silenciou a descoberta, ao ver a aflita corrida do animal que se refugiou dos seus encarniçados perseguidores no barracão da palha.
--Eih! João, viste passar o pulguento?
--Não.
--Carlos deixa-o, não vês que nem um boi consegue ver?

Risada geral entre a criançada, que na sua infantilidade, nem percebe o quanto magoa o seu companheiro, e que continua ansiosa por um novo encontro com a sua vítima.

João, silencioso e de lágrimas a bailarem-lhe, aproxima-se do pequeno coberto, onde o avô guarda a palha com que faz a cama dos animais domésticos, e ajoelha junto do trémulo animal, que sangra de vários ferimentos. Acaricia-o e, com um forte suspiro, regressa a casa para retornar com uma pequena bacia de plástico e o desinfectante com que o avô trata as ovelhas.

O animal lambe-lhe as mãozitas ao sentir-se seguro, e abandona-se aos ternos cuidados, que lhe libertam o fraquíssimo corpo da bicharada que lhe suga o fraco e pouco sangue que lhe corre nas veias.

Após o tratamento, João retira-se, para regressar com uma lata cheia da mesma comida com que alimenta os seus cães, e senta-se a testemunhar a alegria manifestada por quem há muito não mitiga a fome.

Durante uma semana Carracento recupera, a farta alimentação enche-lhe as “peles” e renova-lhe as energias, transformando-o no que sempre foi, um pujante animal.

Mas João é chamado ao hospital para a tão esperada consulta, ficando internado cerca de dois meses e, sem o seu aliado e protector, Carracento decide partir em busca de nova protecção.

Terminado o internamento, João regressa à sua aldeia natal com o coração despedaçado pela perda total da sua visão. Na sua nova condição de invisual, esforça-se por se adaptar à sua nova mobilidade, e tacteia, com a sua bengala de alumínio pintada com listas brancas e vermelhas.

Percorre todo o espaço da pequena propriedade, procurando memorizar cada salto, cada tropeção, para que possa futuramente evitar os muitos obstáculos.

Um dia, maravilhosamente primaveril, encontra-se sentado à sombra do velhíssimo chorão, e aos seus ansiosos ouvidos chega o bulício provocado pelo enorme rebanho na sua passagem. O seu infantil coração reza para que, na sua esteira, venha igualmente o pulguento de que tantas saudades tem.

Na sua ânsia, abandona a protecção da enorme árvore, tacteia com a sua bengala, avança na direcção do bulício, sem perceber que na sua ansiedade, se afasta do rotineiro caminho que já aprendeu a conhecer na sua nova condição. Trôpego, avança passo a passo, entra num novo e desconhecido carreiro, aberto pelas necessidades de novas acessibilidades familiares, e percorre cerca de duas centenas de metros, acabando por tropeçar e precipitar-se, caindo num buraco sem qualquer meio de apoio.

Na sua aflição acredita que grita sem um som sequer balbuciar. Os seus bracitos procuram em vão um ponto de apoio e acaba por desistir e encolher-se ao reconhecer, sobre a sua cabeça, os rugidos lupinos.

Estremece e violentamente ao perceber-se completamente à mercê dos esfaimados animais que perseguem o rebanho. Sabe-se perdido, sem a sua querida visão não tem qualquer meio de defesa.

Encolhe-se no seu canto e chora. Fá-lo porque, como filho da montanha, conhece perfeitamente as suas leis. Nisto, quando já sente o quente bafo dos predadores, eis que outros sons lhe chegam, os de uma encarniçada e mortal luta e grita a pleno pulmão, ao reconhecer um dos rugidos.

Nisto chegam-lhe outros sons, o de vozes humanas que berram na tentativa de afugentar os predadores e, estremecendo, sente-se lambido, assim como coberto pelo que percebe ser uma pata.

O ruído é enorme, as vozes humanas misturam-se, umas de júbilo, outras de aflição e sente-se elevado por uns possantes braços e desmaia.

Hoje, passados dez anos, João é um garboso rapaz que estuda na cidade dos estudantes. Neste momento passeia pela avenida marginal ao rio Mondego de braço dado com uma colega, igualmente invisual.

Seguem ambos, felicíssimos, agarrados a um equipamento em liga de alumínio ultraleve que os liga a um possante animal canino. Este, antes era conhecido por pulguento, carracento, vadio, etc, hoje é adorado como o Fiel, o exemplo da amizade pura e sincera.

Orgulhoso na sua condição de guia do seu melhor amigo, pulguento pára frente ao semáforo, late e lambe as mãos dos seus donos e amigos, dizendo-lhes, descansai que eu continuo aqui.

Pois, como este maravilhoso cão, animal irracional mas que revela uma fidelidade extrema, temos nós, humanos racionais, muito temos que aprender sobre a amizade pura e a fidelidade ao princípio da protecção dos nossos amigos.

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sexta-feira, junho 22, 2012 - 16:57

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José Sereno da Silva

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