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Misteriosa linguagem (II)
Conversa com a tília da minha infância. Um monólogo…
Como te sentes aí, bela e amada tília, na tua serenidade e sabedoria vívida?
Eu sei que tu sentes, mas a tua natureza e forma é mais generosa que a nossa errante armadura humana.
Sentes a água e a húmida terra que te sustem.
Percebes a linguagem que o vento te trás e as vozes varridas dos quatro cantos do mundo: o choro e a dor da miséria, o riso contagiante das crianças transbordantes de vida, a arrogância e o egoísmo dos poderosos e a generosidade e o amor de quem sabe conservar e partilhar o que realmente importa…
Compreendes tudo isso.
Conheces a história das moléculas. A água que agora é tua, já foi minha, já pertenceu aos meus pais, aos meus avós e às estrelas. Um dia fará parte do meu filho e do filho dele…
Bela e amada tília, um dia também tu irás mudar. Deixarás de ser tília e passarás a ser outra coisa.
Por agora, acompanhas as estações e também te transformas harmoniosamente com elas.
[A tília de que falo, já não existe, a não ser na minha memória. Um tempestuoso dia, estaria eu na minha primeira década de vida, caiu com a força do vento, jazendo de raízes expostas na relva do jardim do Morro. Mesmo depois de vencida, serviu de palco durante mais de uma semana às brincadeiras de amigos: as crianças da rua, tal como eu, naquela altura. Em trupe, empoleirávamos nos ramos e escondíamo-nos por entre as folhas, saltávamos, gritávamos, riamos. Depois, tiraram-na de lá. Tenho a certeza de que a lenha que providenciou, era da mais nobre que se pode obter. Estou certo de que aqueceu muitos corpos arrefecidos pelo rigor do tempo.]
A.R.Reserved
Ricardo RodeiA
- Trabalho realizado no âmbito do Curso de Arte-terapia: Práticas artíísticas (Abril 2012)
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