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OS GÉMEOS - 31

.

 

(continuação)

 

As "breves notícias" de James chegaram por intermédio de Madeleine, muito poucos dias depois. Precisamente numa tarde em que o seu aborrecimento era tanto que implicara omissão e, ao sentir aproximar-se dele uma angústia desoladora, se obrigara a refugiar-se num par de auscultadores, escutando sonatas de piano, para espairecer a alma. Preso já às escalas convocadoras da melodia, vira, como coisa longínqua, o gravador de chamadas telefónicas começar a funcionar, e um pouco depois ficar a acender e apagar o sinal de aviso de que efectuara um registo. Nesse momento ainda pensou: — Quem telefonou, por certo Louise, terá de aguardar que me passe a camoeca. — E logo a seguir fechou os olhos e ficou a dormitar durante um pedaço, só acordando sob o sufoco às mãos de Zeca, enclavinhadas no pescoço dele, vencido e sem defesa depois de algumas horas a fugir dele, por lugares inimagináveis.

O pesadelo alagou-o em suor, e, ao dirigir-se para o chuveiro para se refrescar, reparou outra vez no piscar da mensagem. Por automatismo carregou no botão do aparelho, para a reproduzir, enquanto dizia irritado: — Vamos lá ver o que é que ela quer. — E estacou, alvoroçado, porque não era a voz de Louise mas a de Madeleine: — William, tenho pena de não te encontrar aí. Julguei que esta hora não fosse inconveniente para ti. Suponho que estejas bem. O teu irmão acha que é altura de gozares um merecido período de férias. Eu também penso isso. E sou eu própria que estou a convidar-te para vires até cá; pessoalmente, para que não digas que não é possível. Ainda que sejam só duas ou três semanas. Vem. Louise já deve estar a tratar de tudo. Aqui está um tempo muito bom e vais achar isto muito agradável. Eu também... Um beijo para a Hana e outro para ti. Até breve.

Tornou a passar a mensagem. O seu estado de espírito estava naquele momento demasiado estremunhado para receber com ponderação o convite de James. A seguir foi meter-se debaixo de água, abrindo o duche na máxima pressão, na esperança de que a violência com que seria fustigado lhe lavaria também a carga de agressividade que lhe sobreviera durante a sonolência e lhe traria outra vez a clareza de ideias.

Minutos depois, ofegante, fez correr a porta envidraçada da cabina e, quando de relance tentava encontrar o toalhão que deixara pendurado do lado de fora, divisou Hana sentada muito calmamente à mesa de trabalho, entretida a folhear um dos volumes que ele tinha em monte enquanto aguardavam a vez de leitura.

Voltara-lhe alguma lucidez. Por muito que tal fosse depreciativo, face à sua própria liberdade individual, e ele nem se indignava nada com isso, um convite do irmão funcionava na prática como uma ordem transmitida com polidez, porque quando chegava ao seu conhecimento já os acontecimentos tinham sido desencadeados por forma que não lhe restava a ele escapatória. E um pedido de Madeleine era algo que ele próprio não saberia recusar com convicção. A oportunidade era boa. A fase actual das suas experiências atingira um bloqueio que mais se assemelhava a um redemoinho para onde escorregavam todos os raciocínios lógicos ou ilógicos e aí desapareciam, a desfazerem-se em nada, enquanto à superfície da mente um eco da sua própria voz, com ironia, o verberava de vez em quando: — Burro! Burro!... — Para sair daquela confusão ser-lhe-ia necessário dar tempo ao tempo, ter paciência e alheamento. Por acaso, e a propósito, era esse o conselho que lhe vinha da parte de William.

Possivelmente também Hana gostaria de aproveitar o ensejo para umas férias.

— Pouse isso, Hana, e vá fazer as suas malas. Temos de fugir daqui para fora, já, já, já. Andam outra vez atrás de mim. — Procurou ele vociferar com espalhafato, a embrulhar a toalha em volta da cintura e com um esgar brincalhão. — Vá! O melhor é irmos de férias... — ainda acrescentou, antes de a ver tirar os óculos e medi-lo de alto a baixo com um olhar estudioso, como se ele naquela figura tivesse um aspecto zoológico a merecer observação numa perspectiva inexplorada.

— Acho que faz muito bem em ir. Claro que eu não posso. Nesta altura, nem pensar. Mais tarde... Agora, nem pensar. — respondeu-lhe Hana, ao dar por concluído, e parecia que satisfatório, o exame a que o submetera, com um sorriso crítico ainda a espreitar-lhe as canelas peludas e os ossudos dedos dos pés a saraquitarem no tapete, como se lhos considerasse burlescos — Mais tarde, talvez. Isto aqui não pode ficar abandonado.

— Não pode mesmo ir, Hana?

— De facto, não. Mas você deve ir. Até para confirmar se a sua cunhada recuperou bem. Dê-lhe esse prazer. Já há tanto tempo que não a vê...

— Gostava que fosse comigo, mas não insisto.  Fica aqui sozinha...

— Fico bem. Vim dizer-lhe que Louise está à minha espera. Vou a Lameira Grande jantar com ela... temos que combinar alguns detalhes sobre a sua viagem. Até logo! — despediu-se Hana, deixando-o a reflectir que, tal como logo ajuizara, já estava em movimento a organização das suas férias. O que significava que deveria partir muito em breve. Decidiu-se pois, com agradada resignação, a facilitar o evento, dedicando-se a fazer a listagem de procedimentos técnicos de manutenção que Hana respeitaria com toda a meticulosidade durante a sua ausência.
 


 
(continua)

Escrito de acordo com a Antiga Ortografia

 

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segunda-feira, maio 27, 2013 - 11:55

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