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A Verdadeira arte de dizer a verdade

Jorge era um jovem robusto, nascido no belíssimo estado de Santa Catarina, no sul do Brasil. Para tornar-se mais independente, afastando-se da família, resolvera que iria tentar ingressar em uma universidade do estado vizinho. Como cidade mãe para acolher seus anos de estudo, agora que havia conquistado o verdadeiro privilégio de penetrar no tão seleto mundo dos universitários brasileiros; havia escolhido Porto Alegre, a capital gaúcha.
É certo que Porto Alegre é uma ótima cidade onde estudar, mas não podemos deixar de levar em consideração que é igualmente uma ótima metrópole para as coisas da noite. Junte o vento minuano que sopra por aquelas paragens às mais belas mulheres do país e pergunte a si mesmo se não da vontade de aquecer-se entre os verdadeiros becos que são as coxas daquelas divindades.
Jorjão, que era como os amigos o chamavam devido a sua altura e porte, não era fã de tipos como Oscar Wilde, sentia-se embriagado com o mais reles perfume feminino comprado num camelô qualquer da Rua da Praia. Em volta de uma mesa que cheirava a cerveja derramada, onde se reunia de madrugada com seus ébrios amigos, de dedo em riste e as palavras engruvinhadas entre a língua, costumava insistir na velha expressão “Não existe mulher feia, você é que bebeu pouco”! E entre uma farra e outra e entre uma dama e outra, suas notas, tanto universitárias, quanto monetárias iam se esvaindo. Certo dia, Jorjão, se viu em situação difícil. Já há dois dias não colocava nem uma migalha de pão amanhecido no estômago. Havia passado aquele par de dias dormindo, tentando enganar a fome, mas era difícil não acordar de quando em quando com o ronco do próprio estômago. Os amigos sempre lhe emprestaram algum, mas sempre fora por boas causas, como as farras e as mulheres. Dizer que estava passando fome? Não! Nem pensar! E a sua reputação, onde ficava? Andou muito pelas calçadas, pensando numa saída mais digna, até que encontrou a solução para o seu infortúnio. Voltou até seu apartamento, se é que se podia chamar aquele muquifo de apartamento, e vestiu sua melhor roupa, um terno de risca de giz para ocasiões especiais, como os diversos bailes de formaturas que se realizavam duas vezes por ano, no inverno e no verão.
Quando Jorjão entrou pelo saguão daquele hotel luxuoso, de barba impecavelmente feita, com os cabelos besuntados pelo cheiro da brilhantina, e um andar parlamentar que chamava a atenção para o lustre de seus sapatos, ninguém ousou desconfiar que não fosse alguém muito importante. E garboso como estava se encaminhou para o restaurante como se o mármore sob seus pés fosse um tapete vermelho. Escolheu uma mesa com vista privilegiada e recebeu a carta da casa das mãos de um garçom todo eficiente para com o ilustre cliente. Olhou daqui, olhou dali, coçando o queixo enquanto fazia um beiço de desdém e resolveu então encomendar o pedido. O prato mais caro da casa. Ah! E também melhor vinho da adega, safra de 1953. O garçom, muito educado, apenas por precaução, perguntou se o cliente estava certo do pedido, escondendo com seus botões a surpresa, pois nunca ninguém havia se atrevido a pedir um vinho tão caro e há muitos meses que não pediam aquele prato, o último cliente que havia feito tal pedido fora um presidente europeu que estava de passagem pela cidade. Ao que Jorjão confirmou, a cozinha do hotel virou um alvoroço. O chef chegou a espiar por uma fresta, para ver se reconhecia o ilustre cliente.
Como o inesperado pedido havia gerado demora, Jorjão, procurando impor respeito, chamou o garçom e lhe deu uma bronca. As demais pessoas presentes no recinto esticavam o pescoço e olhavam de soslaio para fitar o ilustre cidadão. Todos perceberam que a presença daquele homem mudara completamente a rotina da casa. Quando finalmente serviram sua mesa, acompanhada de mil pedidos de desculpas por dois ou três garçons e mais o gerente, Jorjão, mostrando toda a educação que supostamente recebera, desculpou-se igualmente com os funcionários, dizendo ter se alterado por um momento e ter sido aquela uma atitude indigna, agradecendo em seguida pela serventia dos mesmos.
Comeu como um lorde, saboreando o mais caro vinho da casa, como uma espécie de toque de classe ao momento. Depois pediu uma deliciosa sobremesa e um café. “A sobremesa fica por conta da casa”, disse gentilmente o garçom, instruído pelo gerente, como que para se desculpar pela demora. Terminada a sobremesa, o ilustre Jorge, discretamente, fez um pequeno gesto com o indicador pedindo a conta.
Quando o garçom lhe trouxe o valor do prejuízo, Jorge não titubeou em pedir que chamasse o gerente. Quando este chegou à mesa, suando frio só em pensar em ter errado no valor, criou coragem e, gaguejando, perguntou se havia algo errado. O ilustre cliente pediu para que chegasse mais perto, ao que o gerente correspondeu muito receoso de receber um puxão em sua gravata. E Jorjão, com toda a sua envergadura e descaramento, sussurrou então ao seu ouvido.
- O negócio é o seguinte: Estou há dois dias sem comer. Como achei ter ofendido meu estômago, resolvi lhe compensar fazendo a melhor refeição de toda a sua vida, da qual a minha depende. Pedi o melhor prato e bebi o melhor vinho da casa. Não tenho um centavo no bolso. Se o senhor quiser, pode chamar a polícia, mas antes eu quebro toda esta merda de restaurante - dizia abrindo os braços de Hércules que explanavam o ambiente a sua volta. E continuou. - O senhor é quem sabe. Eu posso ir preso, para mim não importa, pois na cadeia vou comer todos os dias, mas o senhor vai ter um prejuízo do caralho! E então?! O que me diz?!
O gerente olhou discretamente para os clientes do restaurante, olhou no fundo dos olhos de Jorjão, proferindo em pensamento todos os maldizeres aquele sujeito desgraçado, pensando por alguns segundos, e soltou sua sentença.
- Muito bem! Nunca mais volte aqui! Agora retire-se! – disse baixinho.
Depois cumprimentou educadamente seu cliente dando-lhe um forte aperto de mão e um tapinha nas costas, dizendo em voz alta para que os demais clientes ouvissem.
- O que é isso Dr.?! Sua despesa é por conta da casa! E apareça quando voltar à cidade. Estaremos sempre de portas abertas para o senhor!
Jorjão, agradeceu a, digamos..., cortesia, levantando-se e retribuindo as gentilezas e distribuindo cumprimentos aos garçons e ao métre. Depois saiu caminhando da mesma maneira que entrou, senhor de si, cabeça erguida, abotoando o paletó, andando sobre seu imaginário tapete vermelho.
Quando os curiosos clientes tradicionais vieram perguntar ao gerente sobre a procedência do tão venerado cliente, ele empinava o nariz, representando, talvez inspirado pelo tão indigesto cliente, o papel de alguém que não podia deixar de cumprir o papel. E apenas respondia:
- É um dos maiores críticos de cozinhas de hotéis! Experimenta o melhor da casa e se não for do seu agrado, acaba com a reputação da mesma!
 

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quarta-feira, maio 18, 2011 - 16:52

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Maurício Decker

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