A CASA E AS COISAS

A CASA E AS COISAS

Na casa todas as coisas têm o seu lugar
Cada divisão cumpre os seus silêncios absolutos
Na casa há nascimentos festas de aniversário
Casamentos separações e os lutos
Sentimentos que vieram para ficar
As horas de sonhar e todos os ânimos devolutos
Há o condão da prece desfiadas as contas do rosário
As tristezas e a esperança a cada hora
De pensamentos que a vida tece nas alegrias
Que cumprem o tempo e as fantasias
O sonho que em cada um se demora
Nas portas há o calor das mãos e dedadas
A demarcar intenções e quimeras
Há um torpor embaciado de suspiros e horas dadas
Contra o vidro da solidão soprando longas esperas
E um choro amordaçado na força da resignação
Os objetos que deixam as marcas mesmo que o pó
Seja limpo e espanado todos os dias
E nas gargantas há um nó
De pura e intensa emoção
Difícil de desatar
Há lágrimas vazias
Há barulhos por decifrar
Há desespero e desilusão
Ranger de portas fechadas
E balbuciar de vozes arrastadas
E na casa quieta as horas mortas
Dançam valsa na penumbra sombria
Rodopiando uma melodia de poeira sangrenta
Nas frinchas acendidas de luminosidade
Fazem do soalho ao teto um fogo em sinfonia
Do rosa ao lilás da fogueira de sentidos magenta
Há um frio tépido a enamorar-se dos recantos
Impregnando tudo de profunda saudade
Um sentir da casa às coisas de forma desatenta
E no canto do olho demoram-se os prantos
Com raízes espalhadas de infelicidade
Recortando na escuridão poemas por escrever
Como se a alma da casa fosse a folha imaculada
A deixar testemunho do tempo e do ser
E a carne habitada de mim
Em dor e angústia trespassada
Com todos os poemas como bibelots esquecidos
Estátuas por entre as flores de um jardim
Abandonados numa qualquer divisão
Ficassem aí fechados o ser e o sentidos
Com todas as memórias do passado
A recordarem o meu fim
Porque uma casa é toda feita de nós
Tem choros gritos sussurros risos
E por dentro de cada objeto entranhada a nossa voz
Os nossos gestos estranhos e imprecisos
A demorarem-se no colo das palavras para lhes sentir
A verdadeira e adorada emoção
E nesse instante de vida e existir
Saber que a casa tem afetos que dão abraços
Que há amor a consentir
A luz em todos os espaços
E são como um regaço estendido
Onde eu ainda descanso os meus dias
E descubro na casa as coisas e o seu sentido
E em tudo vejo o seu devido lugar
As coisas à casa dão o ser
Mas há um desalinho que eu nunca conseguirei arrumar
Faltam na casa crianças a correr

musa

Submited by

Sábado, Junio 1, 2013 - 15:07

Poesia :

Sin votos aún

musarenascentista

Imagen de musarenascentista
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 9 años 38 semanas
Integró: 05/05/2011
Posts:
Points: 1076

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of musarenascentista

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Poesia/Fantasía ADEUS A UMA ANDORINHA 0 957 10/07/2012 - 14:00 Portuguese
Poesia/Fantasía ALMA PEREGRINA 0 613 10/07/2012 - 13:58 Portuguese
Poesia/Dedicada para o João ... HAVERÁ 0 876 10/07/2012 - 13:56 Portuguese
Poesia/Fantasía DUETO com MARIA TERESA HORTA - POEMA SOBRE A RECUSA 1 851 10/07/2012 - 13:53 Portuguese
Poesia/Fantasía DUETO com DAVID MOURÃO-FERREIRA - PRESÍDIO 0 704 09/20/2012 - 17:45 Portuguese
Poesia/Intervención MÃO DO SENTIR 0 765 09/20/2012 - 17:45 Portuguese
Poesia/Fantasía OSSOS E PÓ 3 582 07/29/2012 - 08:49 Portuguese
Poesia/Fantasía SILÊNCIO DESSE SENTIR 0 574 07/27/2012 - 20:57 Portuguese
Poesia/Fantasía TRINDADE DO SENTIR 0 594 07/27/2012 - 20:55 Portuguese
Poesia/Fantasía VENHO DO CAMPO 0 479 06/07/2012 - 16:27 Portuguese
Poesia/Fantasía SÚPLICA - DUETO COM MIGUEL TORGA 0 672 06/07/2012 - 16:26 Portuguese
Poesia/Fantasía SENTIR ILUSTRADO 0 804 06/07/2012 - 16:23 Portuguese
Poesia/Desilusión PERDIDA DENTRO DE MIM 1 843 04/22/2012 - 23:16 Portuguese
Poesia/Fantasía TUA BOCA 1 548 04/22/2012 - 19:31 Portuguese
Poesia/Fantasía NESTE CORPO QUE É MEU 0 421 04/22/2012 - 18:08 Portuguese
Poesia/Fantasía CAVALO DO TEMPO 4 526 04/22/2012 - 17:57 Portuguese
Poesia/Fantasía FLORES E CHUVA 4 1.075 04/22/2012 - 17:56 Portuguese
Poesia/Dedicada NOSTALGIA D'ALDEIA 0 806 04/11/2012 - 19:12 Portuguese
Poesia/Dedicada FIM DE CENA 2 549 04/11/2012 - 19:08 Portuguese
Poesia/Fantasía ALMA PORTO SOLIDÃO 1 902 12/21/2011 - 12:51 Portuguese
Poesia/Fantasía AVENIDA DOS ALIADOS 2 941 12/20/2011 - 00:38 Portuguese
Poesia/Fantasía PASSOS NUS NA CIDADE 0 613 12/19/2011 - 18:38 Portuguese
Poesia/Fantasía MAR DE VAGAS 0 630 12/15/2011 - 13:37 Portuguese
Poesia/Dedicada PRESÉPIO DE SOMBRAS 0 3.805 12/15/2011 - 13:32 Portuguese
Poesia/Dedicada NATAL 0 563 12/15/2011 - 13:29 Portuguese