DÓLMEN

Longe
distância que o tempo guarda
na memória
silêncio que se despe
atrás das sombras das palavras
eco mudo estrebuchando
do umbigo de um espelho
lembrança por apagar
do suicídio de uma lágrima

Um sino toca no interior de uma gruta
um gesto devolve à terra a sua língua
uma luz dispara da garganta de um poço
para uma multidão com olhos de cera
e costas voltadas para um tempo
gasto pela usura dos relógios

Foi desligada a tomada do pensamento
cérebro em piloto automático
a cerimónia começa com pirotecnia
caleidoscópio de hipérboles e adjectivos
disparando ordens em discurso directo
para corações exangues

O amor aparece sublinhado em legendas
ejaculação precoce de sentidos
o sonho é um vampiro com asas de anjo
que suga da mente o sangue frio dos dias
Felicidade, promessa ignorada
de uma roleta russa
Verdade, palavra esquecida 
nas páginas de um dicionário

Últimos ritos:

Uma moeda com uma palavra de fogo
na ponta da língua
e um fio de água benta a escorrer
sobre testas de barro
o espírito desperta do sonho de si próprio
o mundo despede-se dos olhos que o despiram

Fim da emissão

Tiago Moita
"Post Mortem e Outros Uivos"
WorldArtFriends/Corpos Editora
2012