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exercício de uma aula de escrita criativa onde foram dadas 6 ou 7 personagens e tive de escrever sobre uma.

«A vida é uma merda. Trabalhas como um escravo durante anos, apanhas nesse intervalo triste umas quantas bebedeiras, saltas em cima de uma ou de outra tipa e depois morres.»


É estranho estar a pensar nisto, eu sei. Mas neste momento é a única coisa que faz sentido dentro da minha cabeça. Uma mítica frase proferida por um professor durante uma aula há uns quantos anos, que eu rejeitei em todas as suas direcções naquele momento específico mas que agora se repete na minha mente, cheia de razão.


A vida não é muito mais do que isso. Hoje admito-o, porque a prova está impressa em mim. Fracassei ontem mais uma vez. Provavelmente a última, na empresa onde trabalho. Só me apetece desaparecer deste mundo ingrato ou então, e como dizia aquele professor que hoje se assemelha a Deus na minha cabeça, beber uns copos e saltar em cima de umas tipas mais brilhantes que o meu estado de espírito. E depois desaparecer deste mundo na mesma… Bah… Já nem sei em que pensar, nem se o que penso deve ser realmente o que deveria pensar.


O meu estado sombrio e devastado deve saltar à vista de qualquer um, nesta sala. Todos parecem tão bem em meu redor. Consigo até sentir inveja do tipo mais esquisito que aqui está, aquele que parece guardar com a vida uma mala feia. Mas sobretudo daquela garota negra que salta freneticamente alegre por ir andar de avião pela primeira vez. Sinto é pena dela ao mesmo tempo, sabem. Só espero que desfrute bastante a sua primeira viagem, e todas as restantes primeiras viagens da sua infância, porque daí para a frente tudo será mais escuro, mais negro do que a sua pele ou a dos seus pais. Provavelmente será excluída pela sociedade quando crescer, verá toda a sua inteligência adquirida até então a desfalecer um pouco mais todos os dias, através de desvalorizações levadas a cabo por terceiros, nunca passará de uma mera empregada de balcão ou de limpeza, sendo que, pela sua cor, será sempre uma das piores. Salta menina negra, salta… Sê feliz um dia apenas, que a sociedade é ignorante demais para te deixar ser feliz durante todos os outros dias que te aguardam.


Algumas cadeiras ao lado da menina e dos seus pais está um casal de idosos. Abraçam-se intensamente, como se a realidade doentia onde habitamos acabasse subitamente amanhã. Parecendo ambos seguros de que, depois disso, os seus corpos permanecerão na mesma juntos, tão juntos quanto as suas almas. Sinto inveja deles também. Gostava de me sentir também acarinhado por alguém neste momento. De sentir o calor de uma mão preocupada invadir-me os ombros.


Tenho dado muito de mim à empresa. Às vezes sinto-me até casado com ela. Tenho pensado muito nisso nestes últimos dias, principalmente nestes momentos, em que aguardo por um previsível avião que me levará para casa ou para mais uma reunião de negócios. Por isso não é de admirar toda esta inveja que trago cá dentro, e que me faz invejar até aquele pequeno grupo de adeptos ali ao fundo, junto ao bar, que conversam sobre assuntos triviais mas que fazem tanta falta para que nos sintamos felizes. Ao lado deles, que são provavelmente alheios a todo este stress que trago na bagagem, a toda esta necessidade que tenho em querer sempre ser o melhor, está sentada uma senhora igualmente trivial, com a excepção de pertencer, e julgando pelo aglomerado de sacos que tem à sua volta, a um estrato social mais elevado.


Devia ir ter com ela e dizer-lhe o quão morta está. Admitindo, ao mesmo tempo, o quão morto eu estou também. Á distância não me parece ser má pessoa, talvez tenha tido apenas uma educação tão formal quanto a minha e, por isso, se pareça tão banal e vazia.


Entretanto o speaker interrompe-me o pensamento, avisando-me que tenho mais quinze minutos para decidir se ainda vale a pena tentar ser feliz. Se vale a pena erguer-me desta cadeira eléctrica e apresentar-me enquanto eu próprio àquela mulher incógnita.


«E porque não?», pensei. Levantei-me então da cadeira e rumei com mais esperança na sua direcção. À medida em que me aproximava invadia-me algo inexplicavelmente belo, um sentimento de coragem há muito abafado, palpitações agudas bem no interior do meu peito. Narravam à minha consciência a certeza de que, apesar de todos os nossos fracassos, apesar de todas as nossas diferenças, todos nós temos o direito de sermos pessoas felizes. E era o que eu estava a tentar fazer. A rumar contra todo o convencionalismo que me tinha sido incutido durante toda a minha vida. A rumar com toda a força na direcção emitida pela voz do meu coração, até sentir uma forte dor invadir-me pelas costas.


Fora baleado. Demorara algum tempo a perceber, pois na minha mente apenas fervilhava a frustração de mais uma vez ter fracassado num objectivo. Olhei para um dos lados, o homem da mala corria pelo corredor, seguido por um grupo de indivíduos armados. Olhei também para a cadeira onde estava sentada a mulher que me fizera crer que era ainda possível voltar a acreditar no amor. E senti os meus olhos tristes a fecharem-se quando se aperceberam que ela já não estava lá…
 

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domingo, fevereiro 20, 2011 - 03:00

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RodriguesPedro

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