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BOCA DE LOBO

BOCA DE LOBO
Não sonhas nem dormes... As flores altas que cuidadosamente afastaste diante de ti na passada, são “bocas de lobo” que ali, na Primavera, ultrapassam a altura das nossas cinturas em forma de cachos de todas as cores.
Tinhas ainda muito que andar na paleta do vale disposta entre escarpas de granito até à areia fina de cor de luz. Prosseguiste segura e confiante comigo atrás de ti, de mãos nas tuas ancas que te guiaram e substituíram a visão dos teus olhos vendados com um lenço comprado na loja de conveniência da última estação de serviço.
Estiveste-me entregue a mim por ti mesma, em sinal de reconhecimento da minha capacidade de surpreender os mais dormentes dos teus sentidos. Foi no dia anterior que te desafiei a acordares bem cedo naquele dia e a saíres para onde desconhecias, com um vestido leve de tecido fino, calçado de caminhada e uma máquina fotográfica a tira colo.
“Para!”, disse eu a certa altura. Tinhas uma rocha à tua frente e preparei-te para o que ia fazer de seguida… Peguei-te ao colo e levei-te para um plano elevado que subimos como se de uma escada esculpida pela natureza se tratasse… Apenas um par de metros acima do solo multicolor.
Pousei-te no chão devagar e não resisti a beijar-te, ainda vendada, depois de deixar deslizar as minhas mãos pelo teu corpo desde as curvas do quadril até às costas… Puxei-te para mim e encostei a minha cabeça na tua… depois, o meu nariz no teu… o que te provocou um riso a que dei fim, desferindo um ataque com lábios que se colaram aos teus, por tempo suficiente para parar o mundo, à excepção do vento, que de todos os lados nos atingiu com brandura não susceptível de ser culpabilizado pela falta de ar de que padecemos a fim…
Mal recuperaste o fôlego, tentaste dizer-me algo transformado em onomatopeia que bem me soou, por um chocho breve com que te interrompi deliberadamente. Depressa afastei o rosto do teu em concomitância com o avanço da tua boca, em jeito de quase pedido de prolongamento do beijo.
“Gostaste do beijo do António, foi? Queres mais?”, brinquei antes de me acertares com relativa força no braço, numa pancada e riso que quase me atiraram daquele lugar abaixo, sem que tivesses visto o quase resultado.
“Já chegámos?”, perguntaste.
“Já, burrinha…”, brinquei numa alusão a um personagem de desenho animado que não se cansa de repetir tal pergunta, enquanto me afastei cuidadosamente de uma segunda vaga de sapatada de mão aberta que dessa feita quase me atingiu na barriga.
“Cala-te, por favor…”, sussurrei-te em palavras sopradas junto ao ouvido mantido a descoberto pelo elástico que te prendia o cabelo comprido.
Virei-te na direcção pretendida e abracei-te por trás, com os braços em redor do teu ventre. Beijei-te o rosto, o pescoço eriçado pela brisa e o ombro que o corte do teu vestido me ofereceu desfolhado, ainda com o aroma do creme que te passei depois do banho.
“Preparada?”, interroguei-te de voz estendida em baixo.
“Sim… sim… sim…!”, repetiste, até te puxar uma das orelhas, a mesma que te beijei a meia mordida leve, depois de um “ai” saído com o açúcar que trazes sempre contigo.
Larguei-te então do abraço delongado e levei as mãos á tua cara. Passei as costas da minha mão em toda a pele do teu rosto e o dedo polegar de uma das mãos pela tua boca, enquanto te virei com os dedos restantes, na direcção de onde me sentiste respirar… Não te beijei novamente sem que me visses… e tirei-te a venda dos olhos que me sorriram ainda incomodados pela luz.
“Olha… vê…”. Diante de ti, tiveste um quadro de uma natureza viva e dançante ao ritmo do vento… de cores e tons que julgavas impossíveis de misturar.
“Uau!!!”, exclamaste com espanto, antes de encostares à minha a tua cara molhada por uma lágrima que depois senti salgada.
Rodaste na minha direcção e abraçaste-me, creio que com os olhos fechados por instantes, até que viste do outro lado uma praia, completamente deserta e para a qual correste, puxando-me pela mão até à agua com que molhámos os pés ainda calçados… a mesma água com que me atingiste com as mãos cheias em forma de concha.
Depressa a nossas vestes caíram em monte, atiradas para o meio da areia. O banho de água com sal – por causa do bacalhau existente naquela zona do Atlântico, informei-te –, foi demorado e dele tiramos o máximo proveito, com os corpos e os membros que se esfregaram por toda a extensão das nossas peles.
Corremos em fim, de mão dada até à praia…
“As nossas roupas?”, perguntaste.
“Não te preocupes… vem comigo…”, retorqui perante a tua surpresa…
Chegámos a uma zona por detrás da maior das dunas da praia de Boca do Lobo. Onde as nossas vestes se encontravam dobradas num cabide… Ao lado do cabide, uma mesa com um par de calções e uma t-shirt e ainda um biquini e uma túnica branca de linho. Depois, um leitor de CD’s ainda desligado, uma geleira e duas redes de tecido suspensas a escassos centímetros uma da outra, amarradas a choupos altruístas oferecedores de sombra, diante um lago de água salgada com peixes que pareciam descansar…
À frente no tempo, horas de um dia passado entre banhos de mar e o refúgio onde ambos descansámos numa rede, desfrutando de frutos e bebidas e de massagens de mãos em corpos conhecidos em toques repetidos com o sentimento de singularidade de gestos tão aprazíveis quanto da primeira vez… tal como os beijos molhados fora de água.
Quando fomos embora, refizemos o caminho de volta, a meio do qual te tapei os olhos com as mãos e depois te tirei a máquina fotográfica com que reproduzi a tua imagem, com uma boca de lobo na mão onde tinhas um dedo que reflectia o sol…
Tens hoje uma flor seca em forma de pinha azul celeste e um caule de setenta centímetros, no hall de entrada de casa.
S.L.

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quarta-feira, novembro 9, 2011 - 20:31

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Sergio Lizardo

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