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O Midas

Um segundo de hesitação. Foi o que bastou para a imortalidade de um homem desconhecido, enquanto durar o tempo que me foi dado ao nascer.
Completando 36 anos ontem, aproveitava a primeira noite do resto de minha vida tomando uma cerveja forte com meu amigo Alisson, meu irmão mais novo (adotado por mim como mais novo, mas que pode até ser mais velho, no sentido de experiência e intelectualidade, apesar de seus 29 anos).
O bar estava cheio. Estávamos sentados próximo à porta. A noite estava agradável.
Eis que entra uma espécie de mendigo. Digo espécie porque, apesar do cabelo desgrenhado, com comprimento pouco abaixo das orelhas, o homem tinha um rosto sedutor, e vestia uma jaqueta de couro surrada, mas não rota, apenas batida. Talvez não fosse um mendigo. Era um espécime.
Obviamente não tive essa percepção toda nos três segundos que duraram a aproximação do homem. Essa percepção só viria depois, quando o homem subiu ao pedestal da eternidade.
Não achei estranho que fôssemos os primeiros a ser abordados, uma vez que nos achávamos próximos à porta, apesar de haver duas mesas bem mais próximas... Também não achei estranho que o homem se dirigisse diretamente para mim, pois, uma vez que estávamos em dois, a chance era de cinquenta por cento.
O homem dirigiu a palavra para mim. Antes que eu pudesse demonstrar qualquer reação que não a que tive, de estupefação, o homem já havia deixado o bar.
Motivo: o dono do bar, um cara alto, gordo, pressentiu o incômodo de seus clientes (ah, essa mania que as pessoas têm de pensar por nós...) e o abordou, em apenas... foi rápido (quanto tempo durou aquilo?). Não foi rude. Reconheço que foi até elegante. O espécime, com toda sua vivência de rua, foi tão elegante quanto. “Conheço eles, são meus amigos!” – disse, enquanto sorria para nós com cumplicidade, com um olhar inquirindo: “ Não é, rapazes?”
“Sim, mas os caras não podem te ajudar hoje...” Foi o que disse o dono, com um sorriso tão maroto quanto.
Meu irmão se desculpou, dizendo não ter nenhum trocado, enquanto olhava para mim com uns olhos que pareciam espelhar os meus, com o mesmo olhar de estupefação.
E o homem se foi.
Se foi? Quem seria capaz de afirmar isso?
Apenas havia pedido dinheiro. Mas o motivo...
Abra bem seus olhos e leia isso, abrindo bem seus ouvidos para escutar.
“Com licença, boa noite, irmãos. Negócio é o seguinte, não vou mentir para vocês. Estou precisando de dinheiro para encher a cara. Porque estou completando 36 anos hoje, não tenho dinheiro, mas quero beber até cair... “
Não sei quanto se passou entre essas palavras e o desaparecimento do homem. Só sei que fiz uma longa viagem durante esse pequeno espaço de tempo, inclusive me lembrando de uma época em que pensei em dar uma de Thoureau, chutando o sistema e tornando-me andarilho. Não sei quanto tempo se passou.
Sei quanto tempo durou minha hesitação, diante da aproximação tão rápida do dono do estabelecimento. Um segundo. Seria deselegante ter dado dinheiro ao homem, passando por sobre a autoridade do dono do estabelecimento?
Eu e meu irmão trocamos olhares desconcertados e comentários transcendentais. Foi o que bastou para abrir as portas da eternidade. Eu tinha um bom dinheiro no bolso.
Saí correndo em busca do homem. Andei uma quadra para cada lado, correndo, olhando fundo em cada esquina, perscrutando cada sombra de muro. Voltei para o bar novamente e, inconformado, voltei a buscar o homem. Em vão. O homem simplesmente sumiu.
Qual a chance de isso acontecer? Ele havia escolhido a pessoa certa. E havia sumido, sem saber que lha daria dinheiro o suficiente para morrer de tanto beber se quisesse.
Aquele desgraçado não sabe. Mas adentrou minha vida para sempre.
Brindarei muitas vezes a ele. O Midas, como passei a chamá-lo. Um Midas da cronologia, que tocou em um segundo transformando-o em anos.
Segue em paz, irmão de berço, eterno...

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segunda-feira, dezembro 12, 2011 - 14:22

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Maurício Decker

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