Conto de Natal
Conto de Natal
A Noite estava gélida e seca lá fora, mas ali, no aconchego da lareira da cozinha, da casa rural e pobre, Amélia tinha algum conforto. A electricidade já chegara à casa há alguns anos e a sua companhia, um pequeno rádio eléctrico sempre ligado na Rádio Sim, permanecia enchendo de canções e palavras amigas a sua casa onde há cerca de meio ano, vivia completamente só. O fogo na lareira e as brasas aconchegavam-na enquanto ela ia levando pequenas colheradas de caldo de couves a fumegar até à boca, personalizada pelas rugas dos seus noventa anos.
A malga pousada na mão esquerda estava a fumegar e dava-lhe a sensação de mais calor ainda para a confortar. Faltavam três horas para a meia-noite quando Amélia se levantou de perto da lareira e se resolveu a lavar a louça da ceia. Agarrou uma panelita de ferro que se encontrava perto do fogo e com essa água quente lá lavou a malga e a colher, que mais louça não havia quase nunca para lavar.
Tornou a sentar-se mas sem antes ter ido ao quarto contíguo buscar o seu velho terço que agora se dispunha a rezar. Desligou um bocadinho o rádio e lá se colocou sentada a desfiar os Pais Nossos e Ave-Marias de olhos semi-cerrados.
Na sua prece lembrava-se sobretudo do seu marido Garrido que falecera há pouco mais de meio ano.
Era por isso que sempre que se benzia no final da oração, sempre buscava o lenço para limpar as muitas lágrimas que entretanto lhe tinham vertido face abaixo.
Mas era a noite de Natal, Amélia que sempre fora habituada a afastar a tristeza para bem longe, foi ao rádio levantou-lhe o volume e foi com gosto que ouviu a canção de João Maria Tudela que acabara de dar. “Ah maroto dizia Amélia, tu e o teu chapéu…”
Aconchegou-se com um bonito xaile preto, compôs o lenço à cabeça e passou pelas brasas enquanto a rádio ia tocando o seu programa de Natal. Acordou, já passava da meia-noite, a missa tinha já acabado no rádio e pareceu-lhe ouvir qualquer coisa lá fora a mexer a mexer. Meio amedrontada espreitou ao postigo e era a neve que caía a bom cair sobre todas as redondezas. Há mais de 70 anos que ali não nevava, setenta anos foram os anos em que estivera casada com o seu Garrido.
Ali estava a Mágica prenda de Natal do Menino Jesus para Amélia que nessa noite recordou o seu primeiro Natal de casada, ali como se ao lado do seu velho Garrido.
Levantou os olhos àquele Céu cheiinho de flocos e disse: Obrigado meu doce Menino Jesus por tão Boas Lembranças. Feliz Natal para ti também meu pequenino.
Submited by
Prosas :
- Login to post comments
- 672 reads
other contents of Paulo César Nunes
Topic | Title | Replies | Views |
Last Post![]() |
Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/Sonnet | Meu Rubi | 0 | 520 | 02/29/2012 - 12:03 | Portuguese | |
Poesia/Love | Fala | 0 | 558 | 02/24/2012 - 17:22 | Portuguese | |
Poesia/Love | Quadras Soltas | 0 | 570 | 02/23/2012 - 12:20 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Alma do Mundo | 0 | 510 | 02/23/2012 - 11:26 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Lisboa | 1 | 607 | 02/22/2012 - 16:04 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Pára em mim | 0 | 447 | 02/20/2012 - 14:41 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Cidália Malheiro | 0 | 524 | 02/08/2012 - 14:52 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Quero Amar-Te Senhor | 0 | 524 | 01/31/2012 - 14:02 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Ser ou Não Ser Original | 0 | 511 | 01/30/2012 - 00:28 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Grito de Fé! | 0 | 494 | 01/29/2012 - 16:22 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Rezando | 0 | 531 | 01/29/2012 - 15:14 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Prostrado no Chão | 0 | 471 | 01/28/2012 - 18:48 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Janela de Fé! | 0 | 613 | 01/27/2012 - 15:53 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | A Planta da Mostarda | 0 | 645 | 01/27/2012 - 12:44 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | És o meu Anjo da Guarda | 0 | 644 | 01/26/2012 - 19:25 | Portuguese | |
Poesia/Love | Perdoa-me | 0 | 491 | 01/26/2012 - 16:54 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Já não sou eu que vivo | 0 | 471 | 01/26/2012 - 12:15 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Poetas | 4 | 559 | 01/26/2012 - 11:25 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Espera-me | 0 | 675 | 01/20/2012 - 12:54 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Quando te entregas | 0 | 566 | 01/19/2012 - 14:21 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | O que tem a ver? | 0 | 551 | 01/18/2012 - 15:19 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Senhora Linda | 0 | 667 | 01/17/2012 - 19:09 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Não, porque | 0 | 442 | 01/17/2012 - 17:03 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Aproxima-te | 0 | 606 | 01/17/2012 - 13:05 | Portuguese | |
Poesia/Sonnet | Na Origem Uma Mulher | 0 | 633 | 01/16/2012 - 20:56 | Portuguese |
Add comment