Está bem (Nicolas Guillen)

Está bem
Tudo bem que cantes quando choras, negro irmão,
negro do Sul crucificado;
vai bem teus cantos espirituais*
teus estandartes,
tuas marchas e as alegações
de teus advogados.
Está muito bem.

Tudo bem que patine atrás da justiça,
- oh, aquele ingênuo patinador
tragando o ar até Washington desde Chicago! -;
bem teus protestos nos diários,
bem teus punhos cerrados
e Lincoln em seu retrato.
Está muito bem.

Bem teus sermões nos templos dinamitados,
bem tua insistência heróica
em estar junto dos brancos,
porque a lei – a lei? – proclama
a igualdade de todos os americanos.
Bem.
Está muito bem.
Extremamente bem
Irmão negro do Sul crucificado.
mas lembre-se de John Brown**.
Que não era negro e te defendeu com um fuzil nas mãos.

Fuzil: arma de fogo portátil
(é o que diz o dicionário)
com que disparam os soldados.
Há que se acrescentar: Fuzil (em inglês “gun”):
Arma também com que respondem
os escravos.

Mas se acontecer (isso acontece),
mas se acontecer, irmão,
que não tenhas fuzil, pois então,
nesse caso
digo, não sei,
busca algo
- uma marreta, um pau,
uma pedra – algo
que doa,
algo duro que fira,
que golpeie,
que tire sangue,
algo.

Nicolas Guillen, poeta cubano.

Obs. * (“spirituals” no original)
** abolicionista branco que praticou a insurreição armada para libertar os escravos negros

Submited by

Wednesday, April 11, 2012 - 00:33

Poesia :

No votes yet

AjAraujo

AjAraujo's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 7 years 15 weeks ago
Joined: 10/29/2009
Posts:
Points: 15584

Add comment

Login to post comments

other contents of AjAraujo

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Intervention Orfeu Rebelde (Miguel Torga) 0 7.655 02/22/2012 - 12:57 Portuguese
Poesia/Meditation Os homens amam a guerra (Affonso Romano de Sant´Anna) 0 2.815 01/22/2012 - 12:13 Portuguese
Poesia/Dedicated Eppur si muove [Não se pode calar um homem] (Affonso Romano de Sant´Anna) 0 4.062 01/22/2012 - 11:59 Portuguese
Poesia/Intervention O Leitor e a Poesia (Affonso Romano de Sant´Anna) 0 10.718 01/22/2012 - 11:48 Portuguese
Poesia/Intervention Um despertar (Octavio Paz) 0 3.866 01/22/2012 - 00:14 Portuguese
Poesia/Aphorism Pedra Nativa (Octávio Paz) 0 6.390 01/22/2012 - 00:10 Portuguese
Poesia/Intervention Entre Partir e Ficar (Octávio Paz) 0 4.379 01/22/2012 - 00:05 Portuguese
Poesia/Aphorism Fica o não dito por dito (Ferreira Gullar) 0 3.805 12/30/2011 - 08:19 Portuguese
Poesia/Intervention A propósito do nada (Ferreira Gullar) 0 4.137 12/30/2011 - 08:16 Portuguese
Poesia/Intervention Dentro (Ferreira Gullar) 0 11.675 12/30/2011 - 08:12 Portuguese
Poesia/Thoughts O que a vida quer da gente é Coragem (Guimarães Rosa) 2 4.249 12/26/2011 - 21:55 Portuguese
Poesia/Dedicated Adeus, ano velho (Affonso Romano de Sant'Anna) 0 4.487 12/26/2011 - 12:17 Portuguese
Poesia/Meditation Para que serve a vida? 0 4.467 12/11/2011 - 01:07 Portuguese
Poesia/Dedicated Natal às Avessas 0 3.969 12/11/2011 - 01:03 Portuguese
Poesia/Intervention A voz de dentro 0 5.772 11/19/2011 - 00:14 Portuguese
Poesia/Intervention As partes de mim... 0 3.280 11/19/2011 - 00:00 Portuguese
Poesia/Thoughts Curta a Vida "curta" 0 4.549 11/13/2011 - 13:46 Portuguese
Poesia/Intervention Lobo solitário 0 7.182 11/13/2011 - 13:46 Portuguese
Poesia/Thoughts A solidão na multidão 0 8.320 11/13/2011 - 13:43 Portuguese
Poesia/Thoughts Não permita que ninguém decida por você... Seleção de Pensamentos I-XVI (Carlos Castañeda) 0 13.138 11/12/2011 - 12:55 Portuguese
Poesia/Thoughts Não me prendo a nada... (Carlos Castañeda) 0 4.852 11/12/2011 - 12:37 Portuguese
Poesia/Thoughts Um caminho é só... um caminho (Carlos Castañeda) 0 6.168 11/12/2011 - 12:35 Portuguese
Poesia/Meditation Procura da Poesia (Carlos Drummond de Andrade) 0 3.596 11/01/2011 - 13:04 Portuguese
Poesia/Intervention Idade Madura (Carlos Drummond de Andrade) 0 5.157 11/01/2011 - 13:02 Portuguese
Poesia/Meditation Nosso Tempo (Carlos Drummond de Andrade) 0 6.550 11/01/2011 - 13:00 Portuguese