Horizontes contínguos

Cavo o choro içado no rosto do magma cardial que empedra as artérias do meu caminho…Tenho sabor a sangue e alumínio neste que em mim prende o tremor dos dias de futuro incerto.
Universo o quarto em redor, deste que me tem como ponto largado á solidão dos horizontes contíguos ás janelas da alma.
O que fiz para estar só… tão só;
Sendo que me repugna a compaixão alheia…
Raio vos parta!
Isso, raio vos parta!!!
Este é o meio da idade do nada, indefinido momento abstracto, que na vida de um homem encripta a vida em estradas incógnitas, interrogações fenómeno, charadas de um deus possesso, infinitamente cruel, que á luz do arbítrio se encanta nos abandonos dos espíritos agrilhoados.
A este novo tempo, a estas gerações embargadas de sonho…cuspo!!!
Reclamo viver outra vez, exijo um prolongamento, um desconto de tempo, dez minutos para me explicar ante o juízo do tempo ido, dez minutos sem credos e sem fintas, que me absolverão na certeza que sou parte da solução do crime…e não o criminoso.
Onde está o meu mundo?
Escrevo hoje a todos que dele tomaram parte…
Aos comboios do rossio, aos pombos da praça da figueira, aos becos da Mouraria, ás putas do Intendente…a todos os pontos largados à solidão dos horizontes contíguos ás janelas da alma.
Escrevo…
Á avenida de Ceuta, á Almirante Reis, aos pretos e ao torresmo frito, ao metro dos Restauradores, que tem a hora de ponta mais bela da estação das chuvas.
Um dia vou morrer, como todos os dias morrem…
A estas gerações embargadas de sonho…cuspo!!!
Cuspo á baixeza, á indiferença, á altivez, á simulação,..cuspo porque tenho a merda da humanidade no coração, porque por mais abandonado que esteja não me resigno…eu não me resigno pôrra!
Que se fodam as palmadinhas nas costas e os escritórios de advogados nas torres das Amoreiras, quero que se fodam, os parvalhões de fatinho, nos snack’s das avenidas novas a arrotarem mini-pratos a meio da imperial, que se fodam pois, os jovenzinhos do sistema, os paroquianos caridosos que apregoam a “religião do fodasse”, as perfumarias caras, as universitárias cagadas de pedagogia dez tostões que não valem um furado…
Hoje escrevo…ao Cais do Sodré, aos estaleiros da Lisnave, á margem esquerda do Tejo, ao Tejo, ás gruas e aos contentores das docas vivas de Lisboa que não conhecem o Loft, aos estivadores e aos marinheiros que carregam a bandeira deste país maltratado sem nunca a deixar cair... aos operários, aos pedintes, ao Regueirão dos Anjos, á Sopa dos pobres, ao bairro de Marvila, Alfama, ao Castelo, á Calçada da Picheleira e aos autocarros da carris…
Este é o meio da idade do nada, indefinido momento abstracto, que na vida de um homem encripta a vida em estradas incógnitas, interrogações fenómeno, charadas de um deus possesso, infinitamente cruel, que á luz do arbítrio se encanta nos abandonos dos espíritos agrilhoados.
Á força, se for caso á forca, espantarei os quadros mortos que enfeitam os meus momentos de sofrer e abandono.
Quero descobrir a côr, o ritmo estonteante das cidades a crescer nas fronteiras de uma utopia que consagra o ser fraterno.
Onde está o meu mundo?
Escrevo hoje a todos que dele tomaram parte…
Mãe…
Lembras-te dos Outonos amanhecidos a passear na Rua Augusta com o arco lá ao fundo?
Dizias-me: “Aqui passou a revolução!”
Dá-me a tua mão ausente, quero cheirar as castanhas, espojar-me na calçada a ouvir acordeão…Leva-me a passear na baixa…quero vida…quero som!

Submited by

Friday, February 5, 2010 - 02:13

Poesia :

No votes yet

Lapis-Lazuli

Lapis-Lazuli's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 11 years 2 weeks ago
Joined: 01/12/2010
Posts:
Points: 1178

Comments

vitor's picture

Re: Horizontes contínguos

Mãe…
Dá-me a tua mão ausente, quero cheirar as castanhas, espojar-me na calçada a ouvir acordeão…Leva-me a passear na baixa…quero vida…quero som!

Simples, mas acho este final delicioso, como se tivesse acabado de comer um bom cozido, e arrotado no principio a uma boa litrada de tinto, regalado e entontecido pelas exclamações das palavras.

Um abraço.
Vitor

Add comment

Login to post comments

other contents of Lapis-Lazuli

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Aphorism Nos olhos de Irina 3 772 05/06/2010 - 21:27 Portuguese
Poesia/Dedicated Fabrica das gabardines 5 7.471 05/05/2010 - 22:54 Portuguese
Poesia/Love Querer 7 1.128 05/03/2010 - 00:24 Portuguese
Poesia/Aphorism Magnitude Absoluta 4 1.197 05/01/2010 - 21:02 Portuguese
Poesia/Dedicated Zé, pá... 3 940 05/01/2010 - 12:30 Portuguese
Poesia/Aphorism Relembranças do mundo ausente 3 1.019 04/30/2010 - 12:06 Portuguese
Poesia/Thoughts Indestino 1 995 04/29/2010 - 01:00 Portuguese
Poesia/Love "Do Amor e Outros Demónios" 6 847 04/28/2010 - 03:39 Portuguese
Poesia/Aphorism Incorporal 3 963 04/24/2010 - 00:36 Portuguese
Poesia/Aphorism Desnascimento 1 1.282 04/24/2010 - 00:10 Portuguese
Poesia/Aphorism Homem do nada 4 1.303 04/23/2010 - 00:53 Portuguese
Poesia/Thoughts Tudo passa ás vezes 2 819 04/22/2010 - 23:19 Portuguese
Poesia/Thoughts Viagem breve de ti 3 1.281 04/19/2010 - 09:44 Portuguese
Poesia/Meditation Poemas de Amor 7 1.047 04/17/2010 - 12:20 Portuguese
Poesia/Aphorism Mãos 2 1.063 04/16/2010 - 01:25 Portuguese
Poesia/Meditation Balão Mágico 3 1.002 04/13/2010 - 20:46 Portuguese
Poesia/Thoughts Always the sun 6 1.159 04/12/2010 - 17:20 Portuguese
Poesia/Thoughts Querer não é poder 1 1.026 04/12/2010 - 10:00 Portuguese
Poesia/Aphorism Barriga cheia de nós 2 1.112 04/11/2010 - 21:52 Portuguese
Poesia/Aphorism Ladaínha 1 1.068 04/11/2010 - 17:29 Portuguese
Poesia/Meditation Aspirina 3 1.092 04/10/2010 - 18:25 Portuguese
Poesia/Dedicated Lisboa toda 4 913 04/09/2010 - 17:56 Portuguese
Poesia/Love À espera de nós 3 2.155 04/06/2010 - 18:07 Portuguese
Poesia/Aphorism O Evangelho segundo o desejo 3 697 04/06/2010 - 17:35 Portuguese
Poesia/Thoughts Na cara dos homens 4 879 04/06/2010 - 17:06 Portuguese