Gentes

Como, as águas, são enganosas!
Dizem-se insípidas,
Mas eu acho-as tão saborosas…!
Se são límpidas;
Transparentes;
Agradáveis,
Convidam-me a debruçar-me sobre elas…
A lavar as minhas mazelas.
A beber da sua frescura.
A testar a sua textura…

E quanta transparência elas aparentam…
Mas, se tento olhar através delas,
Logo se escondem, por detrás de mim,
Troçam da minha feição,
Imitam a minha expressão,
Retratando-se com ela…
E gozam com a minha aflição,
Como se nada importasse, tanto assim…
Fazem seu, o meu rosto,
Espelhando-o na sua tez…
E tentam ludibriar-me, outra vez,
Quando o moldam a meu gosto.

Fazem-no dançar, sobre elas…
Querem ler na minha alma,
Inquirir a minha calma,
Mas a nada me intimidam.
Eu afrouxo as cautelas…
Deixo, mas minto…!
Retrato-me, em minha face,
De formas tão diferentes.
Camuflo o que sinto…!
Deixo-as zombar de mim…
E eu minto, minto e minto,
Pois, elas, a tudo, me incitam.

Eu aceno-lhes, com o virtual…,
Mostro-lhes o banal;
Recrio imagens de minha vida,
Exibo-lhes semblantes sorridentes…;
Doces expressões;
Calmas…,
Até penitentes,
Como, as próprias das boas gentes!
Ou, outras,
Próprias de corações ardentes…;
De corações de outras pessoas,
De nobre carácter e de maneiras boas,
Que eu sei serem tão diferentes…!

E neste brincar constante,
Vão trazendo-me gente e gente…,
Em cadeia incessante!
Num desfilar permanente…
Pessoas, que, na vida, dançam comigo
E, outras, que me embalam,
Quantas delas, como se, por castigo!
As, que me amainam, com sorrisos,
Com carinhos, sempre, dados,
Em moldes tão cuidados,
Quando os acham precisos,
A quem elas julgam ser demente,
Ou, de vida, pobre em gente.

E fazem-no naqueles momentos,
Em que eles, mais me são tão precisos…!
E, mesmo, eu sabendo-os indiferentes,
Salteados de enigmáticos sorrisos
E conselhos impertinentes,
De igual modo, eu acolho-os, com sorrisos…

Levam-me a passear, pelos tempos,
Por veredas e caminhos:
Os que gostaria de ter percorrido…
E eu sinto-me, ludibriado!
Mas, também, constrangido…
Porventura apaziguado…!
Eu nem sei, como o consigo…

E rindo-se, do que a vida me fez,
Voltam a espelhar-me, outra e outra vez.
Até, que eu me sinta conformado;
Até, que eu me mostre convencido;
Até, que me imponham a sua sentença!
Até, que, por fim, eu me convença,
Que, em minha vida, nada valeu a pena,
Porque a minha alma foi pequena.

apsferreira

São, tantas, estas gentes... :-(

Submited by

Wednesday, October 21, 2009 - 18:43

Poesia :

No votes yet

apsferreira

apsferreira's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 10 years 1 week ago
Joined: 09/21/2009
Posts:
Points: 3455

Comments

MarneDulinski's picture

Re: Gentes

apsferreira!

Gentes

E rindo-se, do que a vida me fez,
Voltam a espelhar-me, outra e outra vez.
Até, que eu me sinta conformado;
Até, que eu me mostre convencido;
Até, que me imponham a sua sentença!
Até, que, por fim, eu me convença,
Que, em minha vida, nada valeu a pena,
Porque a minha alma foi pequena.
SUA ALMA FOI PEQUENA, GOSTEI DO TEXTO, EMBORA SENDO MUITO LONGO!
MarneDulinski

Poetaminas's picture

Re: Gentes

Amigo, vc tem um discorrer poético muito bom. Não tem palavras rebuscadas tentando confundir o leitor e deixar enignas que devam ser adivinhados. Prefiro assim, falando claro, fazendo colocações lógicas. Vc escreve muito bem e poucos, já encontrei, escrevendo assim.
Grata pelo comentário ao meu poema e volte sempre. bjs

FlaviaAssaife's picture

Re: Gentes

apsferreira,

Gostei do tema, da construção (apesar de um pouco longa), faz meditações profundas, vai e vem no pensamento, real e ilusório misturam-se e retratam-se.

Bom. Abraço.

Add comment

Login to post comments

other contents of apsferreira

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Meditation O Homem e o Passarinho 1 5.961 04/15/2011 - 17:33 Portuguese
Poesia/Dedicated O Perfume, da Bela Rosa 2 2.015 04/01/2011 - 23:35 Portuguese
Poesia/Love O SOL E A LUA (O Ciúme) 1 1.578 03/27/2011 - 12:29 Portuguese
Poesia/Love Alguns poemetos escritos, ao meu amor 1 1.998 03/19/2011 - 00:34 Portuguese
Poesia/Love Meu Amor... 2 1.322 03/02/2011 - 13:15 Portuguese
Poesia/Passion Aquele Momento 1 1.895 02/26/2011 - 15:11 Portuguese
Poesia/Passion Encanto 0 1.960 02/25/2011 - 16:31 Portuguese
Poesia/Dedicated Meu amor, logo ao serão... 3 2.281 02/11/2011 - 21:48 Portuguese
Poesia/Meditation Condescendência 2 1.557 02/11/2011 - 15:36 Portuguese
Poesia/Dedicated Uma flor, para ti 1 1.921 02/11/2011 - 14:18 Portuguese
Poesia/Thoughts Que a minha loucura seja perdoada 1 3.095 02/11/2011 - 03:07 Portuguese
Críticas/Miscellaneous Que a minha loucura seja perdoada 0 3.525 02/06/2011 - 22:10 Portuguese
Poesia/Meditation Reflexão, sobre o Amor (?) 0 4.081 02/03/2011 - 23:16 Portuguese
Poesia/Aphorism Condescendência 0 2.056 02/02/2011 - 19:03 Portuguese
Poesia/Dedicated No Coração, de uma Mulher 0 3.072 01/22/2011 - 13:31 Portuguese
Poesia/Passion Beija-me 1 1.811 01/11/2011 - 19:43 Portuguese
Poesia/Dedicated Os teus Olhos 1 1.472 01/11/2011 - 19:40 Portuguese
Poesia/Love O clarear 1 1.428 01/11/2011 - 19:36 Portuguese
Poesia/Love São raios de sol 3 2.133 01/07/2011 - 22:29 Portuguese
Poesia/Dedicated Declaração de amor 3 3.139 01/07/2011 - 14:39 Portuguese
Poesia/Meditation Será loucura? 2 1.592 01/07/2011 - 14:21 Portuguese
Poesia/Sadness Escuridão 2 1.691 01/06/2011 - 22:41 Portuguese
Poesia/Aphorism As Duas Faces da Moeda 1 1.254 01/06/2011 - 15:44 Portuguese
Poesia/Aphorism Que sou eu? 2 1.383 01/05/2011 - 23:06 Portuguese
Poesia/Love Meu Fado 1 2.136 01/05/2011 - 23:02 Portuguese