Desenhos por me chamar cobarde
A chuva caía incessantemente, desenhando círculos concêntricos na calçada de granito. O petróleo nos lampiões teimava em arder, dando uma luz baça à rua dos sonhos perdidos. A maledicência humana feita gente tombou, nua, no frio da madrugada outonal. Um buraco no céu cor de chumbo abriu-se, e direccionou-a para onde sempre quis estar.
Entre o previsível anoitecer das almas conformadas.
Ao erguer-se, deixou transparecer uma inapta e longa cabeleira ruiva, que assentava irregularmente em ombros magros e fracos. Limpou a poeira da solidão que lhe cobria os olhos, e rodou o pescoço até onde a anatomia o permitiu. Era um espaço deserto o que se preparava para conquistar.
O vento trombetava o hino da vitória, e as luzes trémulas da parca iluminação pública deram-lhe o embalo que precisou para a procura da capitulação.
Ao primeiro passo confiante, seguiu-se um segundo desconfiado. A terceira etapa da rota do sucesso, foi ferida com a machadada da incerteza.
Um corpo desceu de uma escadaria íngreme e derrotada da batalha com o tempo.
Abstraído de vestes, soluçava rezas incompreensíveis que ganhavam estridência, compassadas com o ritmo da chuva que caía, decidida a empalidecer o céu de chumbo.
"Chamo-me vida, e derrotei a minha própria essência nesta rua de sonhos perdidos"
Feminina por aproximação, desapareceu em vãos passos de medo. O caminho ficou aberto, e alguém desenhou o armísticio do rápido impulso bélico que mudou o destino do mundo.
Acho que já me posso apresentar. Escreveram a palavra cobardia no documento que atestou o meu nascimento, e é meu o desenho que apreciam. Estive lá naquela noite de armagedão silencioso, e sobrevivi para contar que o homem não é quem diz ser. Julguem-no antes por aquilo que conseguem ler nas suas costas
Submited by
Prosas :
- Login to post comments
- 1989 reads
other contents of singelo
Topic | Title | Replies | Views |
Last Post![]() |
Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Prosas/Others | Um problema que não chegou a ser | 1 | 850 | 02/25/2010 - 04:17 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | Escrever porque sim | 1 | 955 | 02/24/2010 - 20:56 | Portuguese | |
Poesia/Fantasy | SOS Lua | 1 | 945 | 02/24/2010 - 20:14 | Portuguese | |
Prosas/Others | Longo roncar de pé | 1 | 878 | 02/24/2010 - 15:39 | Portuguese | |
Prosas/Others | God save the queen | 3 | 1.072 | 02/24/2010 - 14:51 | Portuguese | |
Prosas/Others | Poemas vingativos nunca venderei | 1 | 893 | 02/24/2010 - 14:48 | Portuguese | |
Poesia/Fantasy | Mortos a almoçar porque não jantaram e têm fome... | 1 | 776 | 02/24/2010 - 03:55 | Portuguese | |
Poesia/Fantasy | Setas de porcelana | 1 | 1.025 | 02/24/2010 - 03:11 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | Omni(palavra)presente | 1 | 1.005 | 02/24/2010 - 03:09 | Portuguese | |
Poesia/Fantasy | Balada de um covarde funerário | 1 | 1.799 | 02/21/2010 - 14:39 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Girassol esvaziado | 1 | 687 | 02/21/2010 - 14:39 | Portuguese | |
Prosas/Thoughts | As razões que fazem de mim um monstro | 2 | 967 | 02/07/2010 - 23:38 | Portuguese | |
Prosas/Ficção Cientifica | Cidade aos poucos a morrer com tudo desenhado | 0 | 982 | 10/22/2009 - 18:53 | Portuguese | |
Prosas/Drama | Mulher só e feliz por momentos | 0 | 764 | 10/20/2009 - 19:42 | Portuguese | |
Prosas/Drama | As subtis incertezas que a chuva traz | 1 | 873 | 10/17/2009 - 20:42 | Portuguese | |
Prosas/Fábula | A cidade dos que se enojam com a paz. | 0 | 1.101 | 10/03/2009 - 18:39 | Portuguese | |
Prosas/Lembranças | Nunca dita forma de soltar inseguranças | 0 | 762 | 09/04/2009 - 17:13 | Portuguese | |
Prosas/Lembranças | Rosa e quem a vê | 4 | 767 | 08/21/2009 - 18:22 | Portuguese | |
Poesia/Disillusion | Esperançoso | 3 | 760 | 08/02/2009 - 01:28 | Portuguese | |
Poesia/Love | Amorzinhos | 4 | 582 | 07/19/2009 - 10:13 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Rendimento social de inserção | 2 | 744 | 07/16/2009 - 10:57 | Portuguese | |
Poesia/Passion | Similaridades | 4 | 701 | 07/15/2009 - 10:48 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Social Drinker | 4 | 549 | 07/15/2009 - 10:39 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Analisar o que uma velha diz de tudo isto | 7 | 760 | 07/09/2009 - 19:13 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Antes de tu chegares era assim.... | 4 | 776 | 07/09/2009 - 11:07 | Portuguese |
Add comment