No Meio do Nada

Famintos de um odor que os conduza ao êxtase total, acolhem do ar a densidade esmagada pela atmosfera e bafejam rastejantes na dureza fria que lhes corta o ar que respiram. Caminham sempre num único sentido, em direcção ao mar, e de lá mostram a sua verdade ao mundo triste e ensanguentado. Há esperança nos seus olhos e a dor que foi um só momento, é em todos os rostos que descansam em corpos quentes, sujos e gastos pela obscuridade que os consome a custo.
Já não me vejo à solta num caminho só meu, porque estás presente em cada esquina, por entre os becos sujos, na fome dos corpos que os habitam, mas que ao mesmo tempo, se tornam num só momento nesta confusão armadilhada de gentes fora do seu tempo. É nesta certeza imediata que reside um outro caminho que satisfaça os desejos que esperam ainda pelas searas cortadas pelo vento, cientes de uma morte anunciada num olhar escolhido de tempos a tempos.

(Há um motim à solta, morto por ser mais uma presa aberta no tempo)

Há várias escolhas, mas eu continuo por aqui junto à única fonte presente que vai escorrendo, e gota a gota vai saciando a sede de quem vive nu sobre as areias do deserto. Terra infértil, cativa de quantos os que nela viveram, e morreram, nos sulcos empedernidos, é um adorno a quem quiser ser satisfeito por nada ter neste mundo novo.

(Irei comunicar contigo através de um olhar vivo, enleio-me na fortaleza dos teus braços e em jeito de abraço, tomo-te tudo o que me foge por entre os dedos).

Amadureço deitada, absorvendo do sol tardio, a linhagem pura de um vento agreste, tornado quente, envolto em neblinas claras e mortiças que se entregam sem nome a uma boca que engole as tristes sinas. Alheios deste faminto mundo que vive numa cegueira calada e triste, neste deserto que foi tudo para nós, quando nos vimos frente a frente num duelo tornado vivo.

(Há um mundo antigo para lá do sol nascente que morreu à escuras)

Encontro-te sempre que em meus braços nasçam flores, e delas absorva aromas frescos, sémen de vida em essências que claramente serão tornados habitantes de outrora, em que amar era verdade inteira a semear nos nossos corpos, habitados por essências de uma única santidade. O sagrado é só um nome que se espalha no meio do nada, e dele fará emergir novos rostos que queiram caminhar comigo.

(“ A Voz do Silêncio”)

Submited by

Tuesday, January 26, 2010 - 10:28

Prosas :

No votes yet

ÔNIX

ÔNIX's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 13 years 48 weeks ago
Joined: 03/26/2008
Posts:
Points: 3989

Comments

lobo's picture

Re: No Meio do Nada

Gostei muito, até chorei, tu és uma pessoa muito bonita.

ÔNIX's picture

Re: No Meio do NadaP/lobo

Ola

Gostei que tivesses vindo.

Um prazer ler-te também

Beijo

jopeman's picture

Re: No Meio do Nada

Fabuloso,

O motim de uma morte anunciada no nenhures, onde "O sagrado é só um nome que se espalha no meio do nada, e dele fará emergir novos rostos que queiram caminhar comigo."

adorei, favorito

bjos

ÔNIX's picture

Re: No Meio do NadaP/Jopeman

João, que bem me sabe a tua visita

Agradeço de coração todos os teus mimos

beijos

Obrigada

Librisscriptaest's picture

Re: No Meio do Nada

"(Há um mundo antigo para lá do sol nascente que morreu à escuras)"
Onix... Nem sei q te diga... Dos melhores textos q ja li...
Lindo, intenso...
Fiquei extasiada...
E a musica q escolheste tornou-o perfeito, q viagem fabulosa me proporcionaste agora... Muito Obrigada!
Beijinho tão grande em ti!
Inês

ÔNIX's picture

Re: No Meio do NadaP/Inês

Inês

Quase sempre tento escrever esse nome Libri...., mas sinceramente gosto muito do nome Inês

Gostei da tua presença

Beijo em ti e obrigada pelo carinho sempre presente. Lamento não ter podido retribuir da mesma forma

A ver vamos, se tiro um tempinho para todos

Mefistus's picture

Re: No Meio do Nada

Pssst,....

li e reli, e voltei a ler. E só tenho um comentário a fazer.

GENIAL.....

Um dos seus melhores momentos em prosa

parabens

ÔNIX's picture

Re: No Meio do NadaP/Mefistus

Fico sensibilizada com a tua presença sempre Mefistus

Gostava de saber o teu nome verdadeiro

Obrigada pelo carinho

Mefistus's picture

Re: No Meio do NadaP/Mefistus

ÔNIX;
As informaçõs etão em aberto no meu perfil.
Toda a informação possivel lá.
O meu obrigado tambem pela sua constante presença e leitura!

ÔNIX's picture

Re: No Meio do NadaP/Mefistus

Mefistus, desculpe. Na verdade já lá tinha ido, mas não lembrei do nome.

Obrigada por tudo Rogério

Add comment

Login to post comments

other contents of ÔNIX

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Fotos/Landscape Porto Covo 2 2.249 04/07/2010 - 13:48 Portuguese
Fotos/Nature Caminhos 2 1.903 04/07/2010 - 13:42 Portuguese
Fotos/Nature Céu 3 2.180 04/07/2010 - 13:39 Portuguese
Fotos/Cities Cidade Adormecida 2 2.415 04/07/2010 - 13:38 Portuguese
Fotos/Cities Cantares Doces Sobre o Rio Tejo 2 2.718 04/07/2010 - 13:34 Portuguese
Fotos/Nature Vistas Sobre o Rio Tejo 2 1.969 04/07/2010 - 13:30 Portuguese
Fotos/Cities Avenida 2 2.126 04/07/2010 - 13:26 Portuguese
Fotos/Cities Correntes no Rio tejo 2 3.098 04/07/2010 - 13:25 Portuguese
Fotos/Landscape Rio Tejo 2 2.031 04/07/2010 - 13:22 Portuguese
Prosas/Romance Um Mundo Dentro de Um Mundo 2 2.038 04/07/2010 - 08:26 Portuguese
Poesia/Meditation Margens de Mim 8 1.436 03/31/2010 - 15:56 Portuguese
Poesia/Sadness Tão Sozinha 10 1.631 03/31/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia/Meditation Inferno dos Poetas (Parte II) 6 1.466 03/31/2010 - 15:52 Portuguese
Poesia/Meditation Inferno dos Poetas (Parte I) 7 2.215 03/31/2010 - 15:51 Portuguese
Poesia/Dedicated Estrada Sem Nome (Para Inês Dunas) 5 1.411 03/31/2010 - 15:48 Portuguese
Poesia/Meditation Coisas Outras, Sonhos Muitos 3 1.469 03/31/2010 - 15:46 Portuguese
Poesia/Meditation Quisera Eu...(com Jomasipe) 6 1.341 03/31/2010 - 15:43 Portuguese
Poesia/Love Imagina-me 12 2.359 03/31/2010 - 15:41 Portuguese
Prosas/Others Rituais Esquizofrénicos 6 1.533 03/28/2010 - 21:27 Portuguese
Fotos/Landscape Rio Tejo 2 2.276 03/16/2010 - 11:45 Portuguese
Poesia/Dedicated A Tua Poesia (Para Giraldof) 8 1.758 03/12/2010 - 18:39 Portuguese
Prosas/Others Verticalidades (Para JLL) 6 1.593 03/11/2010 - 17:38 Portuguese
Prosas/Romance Há Sempre Um Novo Amanhã 8 1.687 03/11/2010 - 17:30 Portuguese
Prosas/Romance Pinto as Cores do Desejo 0 1.711 03/11/2010 - 17:22 Portuguese
Poesia/Meditation Inconstâncias 4 2.162 03/10/2010 - 13:32 Portuguese