O homem da máquina a vapor
?
kemp, o homem da máquina a vapor, não tinha pressa em descobrir os mistérios da sua existência, afinal ele era, em todos os horóscopos, o próprio mistério por revelar.
Lá fora ouviam-se murmúrios Invernais.
Um Inverno com balas de frio que entravam dentro das salas e dos quartos, pelas janelas da casa.
Aquele frio marcou-o profundamente, ao longo do tempo, com varias cicatrizes em todas as divisões da sua vida.
Naquele dia levantou-se cedo, um pouco antes do dia, com a mesma sensação de sempre, sentia desconforto ao respirar, um ardor nas palavras silenciosas, que tinha que escrever e que alimentavam o deserto desolado que lhe crescia dentro das gavetas da escrivaninha.
kemp, ajeitou o guarda-chuva pendurado no braço, meteu as mãos no fundo dos bolsos e saiu de casa pronto a enfrentar o nevoeiro matinal, deixando para trás a tempestade que se formara no sótão do seu corpo.
Seguiu pela travessa até ao cais, saboreando a maresia fresca e salgada que o vento trazia do mar.
Sabia que ao fundo da rua havia uma praia escondida entre os prédios, lembrava-se bem a última vez que tinha lá estado.
No céu, as gaivotas voavam em círculos sobre o mar encrespado e gritavam por socorro, um peixe afogava-se no aquário dos seus olhos.
Respirou fundo, olhou a cratera que se abriu no chão sob os pés e deixou-se cair imerso na névoa dos seus pensamentos.
Lutou, tentou levantar-se uma e outra vez, apoiando-se nas memórias, mas não conseguiu.
Da praia, das gaivotas e do mar, já nada sabia, o peixe morreu.
Fechou os olhos e as cataratas do Niágara escorreram pelas janelas do prédio castanho que trazia vestido.
Ficou ali sentado durante muito tempo e era o tempo todo que tinha naquele dia para estar só.
A máquina a vapor ia carburando, lentamente dentro do peito, aquelas horas de Inverno.
Submited by
Prosas :
- Login to post comments
- 1229 reads
Add comment
other contents of loftspell
Topic | Title | Replies | Views |
Last Post![]() |
Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/General | A porta dois | 0 | 986 | 05/05/2013 - 12:26 | Portuguese | |
Poesia/General | A água cai e fertiliza a terra | 2 | 1.914 | 04/10/2012 - 01:32 | Portuguese | |
Poesia/General | Quando a brisa vem serena | 1 | 1.360 | 02/29/2012 - 23:31 | Portuguese | |
Prosas/Others | O homem da máquina a vapor | 1 | 1.229 | 02/14/2012 - 21:48 | Portuguese | |
Poesia/General | A porta nova da casa velha | 3 | 1.245 | 01/20/2012 - 00:36 | Portuguese | |
Poesia/General | Cabem entre os homens oceanos inteiros | 2 | 1.194 | 01/13/2012 - 01:42 | Portuguese | |
Poesia/General | Sobre o sentido da vida | 3 | 1.577 | 01/02/2012 - 23:58 | Portuguese | |
Poesia/General | Urgência – A pele sensível das lágrimas | 1 | 1.282 | 12/31/2011 - 01:23 | Portuguese | |
Poesia/General | Urgência – O azul das tuas lagoas profundas | 1 | 1.261 | 12/31/2011 - 01:12 | Portuguese | |
Poesia/General | Urgência – As eras do silêncio | 1 | 1.259 | 12/29/2011 - 22:53 | Portuguese | |
Poesia/General | Urgência – Os despojos do corpo | 0 | 984 | 12/28/2011 - 11:08 | Portuguese | |
Poesia/General | O veículo ou consciência como origem e extinção [A anti-espécie | 0 | 1.358 | 12/12/2011 - 20:37 | Portuguese | |
Poesia/General | Era tempo de morte e ainda não tinha nascido | 1 | 1.449 | 11/26/2011 - 00:21 | Portuguese | |
Poesia/General | O que é contemplar, senão olhar com o pensamento | 3 | 1.655 | 11/19/2011 - 17:33 | Portuguese | |
Poesia/General | As esferas que moldam o mundo [a vida | 1 | 1.572 | 11/15/2011 - 16:12 | Portuguese | |
Poesia/General | Palavras definem palavras | 2 | 1.445 | 10/27/2011 - 20:52 | Portuguese | |
Poesia/General | Escrevo poemas no olhar das pessoas | 2 | 1.901 | 10/22/2011 - 15:16 | Portuguese | |
Poesia/General | Quantas gaivotas sobrevoaram os meus pensamentos | 1 | 2.092 | 10/07/2011 - 20:51 | Portuguese | |
Poesia/General | As cidades ainda brilham | 2 | 1.611 | 10/02/2011 - 22:05 | Portuguese | |
Poesia/General | As brancas do meu pensamento | 0 | 1.488 | 09/30/2011 - 01:10 | Portuguese | |
Poesia/General | Renova-se o mundo nas tardes do meu olhar | 1 | 1.445 | 09/19/2011 - 02:23 | Portuguese | |
Poesia/General | Cada vez que assomo à janela e o vento bate assim | 1 | 1.495 | 08/31/2011 - 21:45 | Portuguese | |
Poesia/General | É meia-noite e a Lua chama-se amor | 0 | 1.566 | 08/17/2011 - 18:02 | Portuguese | |
Poesia/General | Em cantos da alma | 2 | 1.425 | 08/05/2011 - 23:21 | Portuguese | |
Poesia/General | Morrem no peito Legiões | 2 | 1.345 | 07/01/2011 - 16:45 | Portuguese |
Comments
Querido amigo, Estou
Querido amigo,
Estou maravilhada com a leitura que fiz e refiz dessa tua excelente prosa...
Simplesmente,magnífico!!!
Beijo