O homem feito em palavras

O homem feito em palavras
É cada ser pulsante
Que caminha sobre tudo o que é vivo.
Não é carne, é verbo.
Não respira — declama.
Carrega no peito um dicionário de sonhos,
E nas mãos,
O silêncio que só a poesia sabe ouvir.

Porque o verbo nasceu antes do passo,
E o nome veio antes da face.
O homem, este poema em carne,
Vive entre o que sente e o que diz,
Entre o som e o sentido.

O homem feito em palavras
Não é apenas o que diz,
Mas o que tenta dizer e nunca alcança.
É construção infinita —
Um eco do que sente,
Um reflexo imperfeito do ser.

Cada ser pulsante
Que caminha sobre tudo o que é vivo
Carrega dentro de si uma biblioteca invisível.
Línguas não ditas,
Sentidos que escorrem entre os dedos da razão.
O humano é um texto em constante reescrita,
Feito de dúvidas, metáforas e silêncios.

Viver é interpretar-se.
Ser é traduzir o indizível.
E enquanto caminha,
O homem busca uma palavra que o defina —
Mas ela nunca vem completa.
Talvez porque a verdade do ser
Não caiba em vocábulos,
Mas no intervalo entre eles.

Há uma essência que antecede a matéria: o verbo.
O homem não nasce apenas do barro ou do sangue,
Mas da palavra que o nomeia.
Antes mesmo de saber quem é,
Ele já foi dito por outro
E, ao ser dito, foi moldado.

O ser humano é um texto em constante revisão.
Não é estático, nem plenamente compreendido.
Cada indivíduo caminha como um manuscrito aberto,
Com margens riscadas de desejos,
Erros, e verdades provisórias.
A linguagem não o limita — o revela em fragmentos.
O que escapa à linguagem, porém,
É o que mais o define.

Toda tentativa de se dizer
É também um gesto de criação.
Falar de si é nascer de novo,
E cada palavra usada para explicar o que se é
É também uma tentativa de escapar do que se foi.

Caminhar sobre tudo o que é vivo
É, portanto, um ato de tradução.
O mundo é um texto sem pontuação final,
E o homem, esse ser pulsante,
É leitor e autor ao mesmo tempo.
Interpreta a si mesmo no reflexo do outro,
E, na escuta silenciosa da vida,
Reconhece que existe mais no não dito
Do que no que ousa ser pronunciado.

Talvez, no fim, o que somos
Não caiba na lógica ou na gramática,
Mas apenas no mistério poético de estar vivo:
Um poema inacabado,
Escrito a cada passo
Sobre a superfície do ser
.

Poema: Odair José, Poeta Cacerense

www.odairpoetacacerense.blogspot.com

Submited by

Sunday, April 6, 2025 - 15:28

Poesia :

No votes yet

Odairjsilva

Odairjsilva's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 14 hours 18 min ago
Joined: 04/07/2009
Posts:
Points: 19780

Comments

Odairjsilva's picture

Visitem os

Odairjsilva's picture

Visitem os

Odairjsilva's picture

Visitem os

Odairjsilva's picture

Visitem os

Odairjsilva's picture

Visitem os

Odairjsilva's picture

Visitem os

Odairjsilva's picture

Visitem os

Add comment

Login to post comments

other contents of Odairjsilva

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Meditation O que buscas? 7 1.092 05/09/2025 - 01:15 Portuguese
Poesia/Meditation O último suspiro 7 676 05/06/2025 - 20:01 Portuguese
Poesia/Thoughts Viver é mais que existir 7 1.454 05/05/2025 - 19:09 Portuguese
Poesia/Disillusion Saudade, ciúme e desespero 7 1.313 05/05/2025 - 03:45 Portuguese
Poesia/Disillusion Febre mansa 7 1.106 05/04/2025 - 14:00 Portuguese
Poesia/Disillusion Esperança e vontade 7 481 05/03/2025 - 13:56 Portuguese
Poesia/Intervention O que realmente importa? 7 4.484 05/02/2025 - 14:31 Portuguese
Poesia/Thoughts O tempo é espelho 7 1.512 05/01/2025 - 13:33 Portuguese
Poesia/Love Não é rebeldia 7 647 04/30/2025 - 21:13 Portuguese
Poesia/Love Quando amar é um crime 7 2.047 04/29/2025 - 20:19 Portuguese
Poesia/Meditation O outro lado da História 7 1.326 04/28/2025 - 20:57 Portuguese
Poesia/Thoughts A memória do meu futuro 7 1.520 04/27/2025 - 14:40 Portuguese
Poesia/Love Alguns encontros 7 1.082 04/27/2025 - 03:36 Portuguese
Poesia/Disillusion Te amar me pesa 7 993 04/26/2025 - 02:32 Portuguese
Poesia/Intervention A geração ansiosa 7 714 04/24/2025 - 22:31 Portuguese
Poesia/Meditation O Homem que Ninguém Libertou - Parte III - (O Que Veio Depois) 7 1.860 04/23/2025 - 20:16 Portuguese
Poesia/Meditation O Homem que Ninguém Libertou - Parte II - (A Ruptura) 7 1.135 04/22/2025 - 21:17 Portuguese
Poesia/Meditation O Homem que Ninguém Libertou - Parte I - (A Rotina) 7 545 04/21/2025 - 17:35 Portuguese
Poesia/Thoughts Os caminhos da razão 7 1.163 04/20/2025 - 23:11 Portuguese
Poesia/Love Próximo do infinito 7 625 04/20/2025 - 14:25 Portuguese
Poesia/Intervention Indubitável 7 900 04/19/2025 - 18:29 Portuguese
Poesia/Joy Saber viver 7 853 04/19/2025 - 13:55 Portuguese
Poesia/Meditation Entre circuitos e silêncios 7 932 04/18/2025 - 13:36 Portuguese
Poesia/Meditation Vestígios em ruínas 7 347 04/17/2025 - 14:36 Portuguese
Poesia/Thoughts Escultor de silêncios 7 1.411 04/16/2025 - 22:20 Portuguese