Não pode ser amor

Vagueava pela rua quando os meus olhos cruzaram com os teus e o meu coração bateu em falso, levando tempo para retomar ao seu normal compasso.
Um sorriso tímido te lancei, como um " Olá" e um "Estás aqui", para que saibas que a tua presença foi notada e que a apreciei.
Uma vez mais, caminhar em frente, deixando-te para trás, se mostra uma tarefa de difícil digestão. Cada passo no sentido oposto ao teu é um gesto necessário que o meu corpo executa sem compreender.
O tempo parece parar. Quem me dera que parasse no momento em que os nossos olhos se cruzam. Vejo-me assim ardendo tranquila na certeza do infinito. Todo o tempo para te olhar, ainda que não te tocasse, como linhas paralelas convergindo para um horizonte comum.
Isto que sinto não é amor. Não pode ser.
O amor dá frutos e esta obsessão não só não me dá nada, como me rouba tudo o que construí. É verdade! Estou a fazer regressar ao pó tudo o que edifiquei. Creio que nos escombros e no mais completo vazio encontrarei uma razão que faça sentido e que explique porque me sinto como sinto quando estou ao pé de ti e que me diga porque te sinto quando passo uma vida sem te ver.
Isto que sinto não é amor. Não pode ser.
Hoje conheço uma mágoa profunda, onde a raiva transfigurou o meu desejo num cio avassalador. Queria-te tanto que não te poderia dizer... Se o dissesse - pensei- seria como colocar uma coleira no meu pescoço e a trela na tua mão...
Isto não é amor. Não pode ser.
Lutei contra a minha vontade quando te pedi que me colocasses no chão quando estava capaz de fazer amor contigo ali mesmo, sob o sol daquele candeeiro e na cama daquela parede. Antes dar-me a provar nas areias douradas a outro qualquer, do que perder-me, achando-me em ti.
Um olhar e eu afasto-me com passos apressados, nas mãos a garganta contendo o rugido. Na distância encontro uma vítima, solto a selvática ordem, um imperativo do verbo querer e tomar.
_Quero-te e tomo-te... És meu!
Não é um grito, mas um rugido que se descola e arranha as paredes vocais até à superfície. A presa reage atordoada por tamanho arrebatamento e deixa-se devorar... O seu sacrifício acalma-me, mas não me satisfaz. Sou eu quem controla e isso basta-me no momento em que o meu desejo reclama que me perca.
Sei no meu íntimo que contigo seria como se me privasse de respirar e tivesse o maior prazer em sufocar lentamente... Anseio por te ter, mas na verdade tenho igual medo. Olho para ti e esqueço-me de inalar. Na verdade não há nada que me recorde.
O tempo não pára de facto, mas o mundo desaparece...

Isto não é amor. Não pode ser.

.

Submited by

Lunes, Abril 25, 2011 - 00:43

Prosas :

Sin votos aún

Ema Moura

Imagen de Ema Moura
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 4 años 47 semanas
Integró: 03/15/2011
Posts:
Points: 317

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of Ema Moura

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Ministério da Poesia/Desilusión Suspensa no infinito 0 464 03/27/2011 - 01:35 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Assim se baila El Tango! 0 513 03/26/2011 - 18:54 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Desejo felino 0 398 03/25/2011 - 16:01 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Procura, encontra e tem! 0 319 03/24/2011 - 00:30 Portuguese
Prosas/Cartas Podemos conversar? 0 1.059 03/22/2011 - 15:43 Portuguese
Prosas/Pensamientos Podar é preciso! 0 751 03/20/2011 - 17:33 Portuguese
Ministério da Poesia/Desilusión Deixa-me ir! 0 409 03/19/2011 - 22:53 Portuguese
Prosas/Contos Uma Vontade 0 748 03/18/2011 - 14:57 Portuguese
Prosas/Contos Rosa-dos-ventos 0 716 03/15/2011 - 16:30 Portuguese
Prosas/Contos Cupido 0 742 03/15/2011 - 16:23 Portuguese
Prosas/Erótico Amar é levar o pequeno-almoço à cama 0 1.676 03/15/2011 - 16:13 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Meu vício 0 518 03/15/2011 - 15:53 Portuguese
Ministério da Poesia/Intervención Em queda livre 0 603 03/15/2011 - 15:50 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Insanidade 0 550 03/15/2011 - 15:22 Portuguese
Ministério da Poesia/Amor Porque mereço... 0 517 03/15/2011 - 15:19 Portuguese
Ministério da Poesia/Desilusión Claramente 0 674 03/15/2011 - 15:16 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Exalar 0 558 03/15/2011 - 12:34 Portuguese
Ministério da Poesia/Desilusión Livre 0 586 03/15/2011 - 12:28 Portuguese
Ministério da Poesia/Desilusión Mastigo-te! 0 566 03/15/2011 - 12:26 Portuguese
Ministério da Poesia/Meditación Reflexos da Alma 0 637 03/15/2011 - 12:22 Portuguese
Ministério da Poesia/Erótico Promete 0 996 03/15/2011 - 12:19 Portuguese
Ministério da Poesia/Dedicada Essência 0 631 03/15/2011 - 12:15 Portuguese
Ministério da Poesia/Intervención Queria ser livre 0 502 03/15/2011 - 12:12 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Agarra-me! 0 573 03/15/2011 - 12:08 Portuguese
Ministério da Poesia/Pasión Perco-me 0 548 03/15/2011 - 12:06 Portuguese