CHOCALHO DE SAUDADE

O silêncio é a multidão que resta
pela fria calçada encascalhada de vazio
nas ladeiras desentendidas na cascata do pensar,

é a mais rude aresta em ruinas num sorriso
que envelhece pelas esquinas
da eternidade.

É o silêncio o mais inóspito ar,
por onde indiferente o olhar voa
esquecido à toa pelo chão de outroras,

por onde sujo de tantas horas de outras vidas,
o sentir, é o frágil casco de uma canoa de solidão
cuja proa a pique cai em cruas vertigens de desilusão.

É o silêncio o mais fino
e puro fio condutor das sombras
que me alagam o sol da alma com lágrimas,

gotas de quase sangue desgarradas pelo pulsar
de andares por aí calçados de nada.

É o silêncio
o mais engrenado chocalho de saudade,
onde a verdade agita todas as lamas da morte,

ócio assente no fundo de um infinito findo
em indo que caminha sobre mais indo
até chegares que fraudam sonhos.

Está nas mãos do silêncio o afago
que afaga as entrelinhas do quotidiano
onde medonhos agoras jazem irrequietos,

sinfonia só, vento
encorpado de ásperas poeiras,

fogueiras de insanos tactos
que escurecem os tectos da noite,

que acontecem no golpe de um açoite
de acordada insónia nos serões da ansiedade,

brincadeira endurecida pelos barros do tempo,
pontapés pontapeados por derrocadas
de desespero em dor.

Pisca-pisca no silêncio lembranças
que estalam como pipocas
no caldeirão da vida.

É o silêncio a última onda
que rebenta aos pés da poesia
nas praias de imperfeitas musas,

caverna de tusas e tosses
onde os lábios gritam por amor,
onde o corpo sem eco se enruga de tristeza.
.
.
Henrique Fernandes

Submited by

Sunday, January 11, 2015 - 17:30

Poesia :

No votes yet

Henrique

Henrique's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 9 years 8 weeks ago
Joined: 03/07/2008
Posts:
Points: 34815

Add comment

Login to post comments

other contents of Henrique

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Thoughts DA POESIA 1 8.068 05/26/2020 - 23:50 Portuguese
Videos/Others Já viram o Pedro abrunhosa sem óculos? Pois ora aqui o têm. 1 43.239 06/11/2019 - 09:39 Portuguese
Poesia/Sadness TEUS OLHOS SÃO NADA 1 3.911 03/06/2018 - 21:51 Portuguese
Poesia/Thoughts ONDE O INFINITO SEJA O PRINCÍPIO 4 4.514 02/28/2018 - 17:42 Portuguese
Poesia/Thoughts APALPOS INTERMITENTES 0 4.316 02/10/2015 - 22:50 Portuguese
Poesia/Aphorism AQUILO QUE O JUÍZO É 0 4.928 02/03/2015 - 20:08 Portuguese
Poesia/Thoughts ISENTO DE AMAR 0 6.394 02/02/2015 - 21:08 Portuguese
Poesia/Love LUME MAIS DO QUE ACESO 0 5.625 02/01/2015 - 22:51 Portuguese
Poesia/Thoughts PELO TEMPO 0 4.301 01/31/2015 - 21:34 Portuguese
Poesia/Thoughts DO AMOR 0 4.081 01/30/2015 - 21:48 Portuguese
Poesia/Thoughts DO SENTIMENTO 0 4.574 01/29/2015 - 22:55 Portuguese
Poesia/Thoughts DO PENSAMENTO 0 4.316 01/29/2015 - 19:53 Portuguese
Poesia/Thoughts DO SONHO 0 3.802 01/29/2015 - 01:04 Portuguese
Poesia/Thoughts DO SILÊNCIO 0 5.137 01/29/2015 - 00:36 Portuguese
Poesia/Thoughts DA CALMA 0 4.988 01/28/2015 - 21:27 Portuguese
Poesia/Thoughts REPASTO DE ESQUECIMENTO 0 3.965 01/27/2015 - 22:48 Portuguese
Poesia/Thoughts MORRER QUE POR DENTRO DA PELE VIVE 0 4.399 01/27/2015 - 16:59 Portuguese
Poesia/Aphorism NENHUMA MULTIDÃO O SERÁ 0 3.731 01/26/2015 - 20:44 Portuguese
Poesia/Thoughts SILENCIOSA SOMBRA DE SOLIDÃO 0 4.692 01/25/2015 - 22:36 Portuguese
Poesia/Thoughts MIGALHAS DE SAUDADE 0 3.575 01/22/2015 - 22:32 Portuguese
Poesia/Thoughts ONDE O AMOR SEMEIA E COLHE A SOLIDÃO 0 3.419 01/21/2015 - 18:00 Portuguese
Poesia/Thoughts PALAVRAS À LUPA 0 4.682 01/20/2015 - 19:38 Portuguese
Poesia/Thoughts MADRESSILVA 0 3.509 01/19/2015 - 21:07 Portuguese
Poesia/Thoughts NA SOLIDÃO 0 4.073 01/17/2015 - 23:32 Portuguese
Poesia/Thoughts LÁPIS DE SER 0 4.168 01/16/2015 - 20:47 Portuguese