Rosa-dos-ventos

Na imensa escuridão e na hora mais silenciosa, ainda que os meus olhos permaneçam fechados, raios de luz despertam-me de um sono profundo e notas musicais vestem-me de vermelho e de cristal.
Confio e não temo a brisa que me incentiva a sair do meu nicho...
_Vem...por aqui, anda! - Diz num suspiro, como se há muito me esperasse.
Sigo a fragrância que ilumina o caminho, conduzindo-me por passagens cinzentas até uma janela que pensei não existir.

Lá fora há sorrisos e a melodia convida-me a subir para o parapeito daquela janela, com se de uma porta se tratasse. Subitamente, vejo-me rodeada por mil borboletas, pequenos arco-íris alados que me transportam como não fosse um fardo, apenas penas!
Sobrevoamos um jardim de águas tranquilas que me beijam saudosas!

Toda eu sou brilho, cor, luz... anseio saber para onde me levam, mas receio quebrar o encanto, talvez acordar.
Tudo o que vejo corre-me nas veias como se fosse parte daquele todo. Estarei eu a sonhar?
Sonho ou não, não me rendo, entrego-me!

O vermelho do meu vestido intensifica-se em harmonia com as minhas emoções... sou desejo!
O meu riso ecoa no paraíso e o eco devolve-me mil vozes que me saúdam.
O meu coração é um tambor na selva quando os meus pés tocam um chão forrado de pétalas. A seda acaricia-me e eu agradeço bailando em pontas, tentando preservá-las o mais possível.
Sigo o caminho serpenteado, esculpido pelas raízes criadoras de toda aquela imensa vida.
A cada rodopio sinto mais firmeza, executo uma coreografia de um bailado que os meus gestos parecem recordar.

_Eu sou uma rosa-dos-ventos! - Grito quase tão infantil como o foi um dia, ali naquele mesmo lugar. Um grito que retirou todo o ar, para que respirasse apenas as memórias que eu mesma plantei.
Instintivamente grito de novo em todas as direcções e enquanto a minha voz ecoa no espaço, o eco devolve-me, no silêncio que se fez, apenas uma voz que diz:
_ Tu és uma rosa-dos-ventos e eu sou o cardeal de todos os teus pontos! Se me procurares encontras-me e se me encontrares...
_ Encontro-me! - Completo, como se de uma lengalenga se tratasse, algo repetido ao longo de anos, mantido em segredo dentro de mim.

Ilumino-me como um cristal, a brisa envolve-me e dança comigo, feliz, mas pretendendo confortar-me e num sussurro solene diz:
_Chegou a hora que o galo anuncia aos homens como o nascer de um dia e às almas que é tempo de regressar!
_ Mas, eu sou uma rosa-dos-ventos que perdeu o cardeal dos seus pontos e este espera por mim - Respondo sem compreender!
_ Logo chegará a hora silenciosa que te trará de novo a este lugar e a cada noite se clarificam as memórias, conduzindo-vos rumo ao encontro. Porque o que um perdeu o outro procura. Ambos são partes de um todo, que se completa quando a busca conhece o seu fim.

De olhos postos no infinito que se oculta com o raiar do dia, rendo-me à força que me puxa de volta.

Feliz na ignorância, abençoado caminho!
Por hora, saber que existes basta-me! - murmúrio que ecoa no vazio, enquanto os meus olhos se abrem e a minha alma adormece.

 

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Tuesday, March 15, 2011 - 16:30

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